Sigmaringa Seixas, que trocou a vida de deputado
por negociador nos bastidores do poder, tem longa ficha de serviços prestados
ao PT

Em 1989, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava à procura de um vice para
acompanhá-lo na disputa presidencial. Fernando Gabeira, o nome originalmente
escolhido, havia deixado a coligação por pressão dos partidos aliados. Lula
cogitava chamar Cristovam Buarque, que acabara de deixar a reitoria da
Universidade de Brasília (UnB). Para intermediar o contato, convocou um amigo
em comum: o advogado e deputado
Luiz Carlos Sigmaringa Seixas. Ambos visitaram
Cristovam para sondá-lo sobre a possibilidade. ...
O ex-reitor
não prolongou a conversa porque já havia se comprometido a apoiar Leonel
Brizola (PDT), mas o episódio é só um de incontáveis exemplos da atuação de
Sigmaringa na política brasileira nas últimas décadas. Quase sempre, como em
1989, nos bastidores: "Ele não faz questão de aparecer. Eu acho até que
ele faz questão de não aparecer", diz o senador Cristovam (PDT-DF), que
continua amigo do petista.
É verdade
que Sigmaringa, nascido em Niterói e formado em Direito na Universidade Federal
Fluminense (UFF), já ocupou funções importantes: fez parte da Assembleia
Constituinte de 1988, foi deputado federal por outras duas vezes seguidas,
disputou – e perdeu – o cargo de vice-governador do Distrito Federal e retomou
um assento na Câmara dos Deputados de 2003 a 2007. Mas a atuação mais
importante dele sempre foi à margem do poder oficial. E continua sendo: o bom
trânsito com advogados e políticos petistas explica sua presença no gabinete de
José Eduardo Cardozo, o ministro da Justiça, no dia em que o chefe da Polícia
Federal tratou com o advogado Sérgio Renault, defensor da empresa UTC, dos os
rumos da Operação Lava Jato. Como mostrou VEJA, Cardozo usou a reunião para
tranquilizar o representante da empreiteira, investigada por pagar propina a
integrantes da cúpula da estatal.
A discrição
de Sigmaringa Seixas talvez seja menos uma característica pessoal do que uma
habilidade aprendida em outros tempos: militante do então clandestino Partido
Comunista Brasileiro, o advogado foi uma figura importante no enfrentamento ao
regime militar na capital federal. Nas décadas de 1970 e 1980, ele auxiliava
presos políticos, sindicalistas e estudantes perseguidos pela ditadura. "O
Sigmaringa com quem nós convivemos era clandestino no Partido Comunista
Brasileiro. Era um simpatizante, sempre foi uma pessoa muito solidária nos
confrontos que nós tivemos no movimento sindical e estudantil", diz o
deputado federal Augusto Carvalho (SD-DF), outro amigo próximo do petista.
Foi nesse
período que Sigmaringa, filho de um advogado conhecido em Brasília, se
aproximou de figuras tanto no meio jurídico, como os ex-ministros do STF Nelson
Jobim e Maurício Corrêa, quanto de políticos de esquerda. Em 1987, foi eleito
para a Assembleia Constituinte pelo PMDB. Lá, sua habilidade de negociador se
destacou. "O Sigmaringa é uma pessoa articulada. Na Constituinte ele
conversava com todos os partidos e tinha muitas amizades lá dentro" diz
Maria de Lourdes Abadia (PSDB), ex-deputada e ex-governadora do Distrito
Federal. Foi nesse período que o advogado se aproximou de figuras como Mário
Covas, José Dirceu e Luiz Inácio Lula da Silva.
Além de bom negociador,
Sigmaringa Seixas sempre foi conhecido por ser uma pessoa moderada – pelo menos
em comparação com seus colegas de militância. Em 1991, a convite do
ex-governador Mário Covas, Sigmaringa ajudou a fundar o PSDB do Distrito
Federal. Quatro anos depois, deixou o partido por não aceitar a filiação de
José Roberto Arruda, recém-eleito senador, à sigla. Só então, quase que por
acaso, migrou para o PT.
Em sua nova
legenda, manteve os laços de amizade com colegas de outras siglas. Em 1998, por
exemplo, conseguiu fazer com que José Serra, então ministro da Saúde, subisse
em um palanque petista: o tucano apoiou Cristovam Buarque na eleição para o
governo do Distrito Federal. O presidente Fernando Henrique Cardoso ficara ao
lado do outro candidato, Joaquim Roriz.
Seu
temperamento provocou algumas contradições: Sigmaringa é amigo leal de
mensaleiros como José Genoino e José Dirceu, mas também é próximo a ministros
do Supremo Tribunal Federal que ajudaram a condená-los. É um defensor do PT e
cumpre missões partidárias sem titubear, mas permanece uma figura respeitada
entre os tucanos.
Sigmaringa
Seixas nunca foi flagrado em atos de corrupção ou negociando tráfico de
influência. Mas sua proximidade com os poderosos costuma atrair interessados em
se aproximar da cúpula do partido. Em 2008, por exemplo, foi flagrado em uma
conversa com o também advogado Luís Eduardo Greenhalgh sobre uma
"estratégia de aproximação" entre o banqueiro Daniel Dantas e o
governo.
Como homem
de confiança de Lula, o advogado teve participação direta nas indicações do
governo petista ao Supremo Tribunal Federal desde as primeiras indicações, como
a do ministro Cezar Peluso, até as mais recentes, como Luís Roberto Barroso e
Luiz Fux. Em 2008, o então presidente Lula indicou um ex-sócio de Sigmaringa,
Arnaldo Versiani, para uma cadeira no Tribunal Superior eleitoral. No ano
seguinte, Lula queria nomear o aliado como interventor federal na capital da
República durante a crise que afastou o próprio Arruda do cargo, em 2009. Mas o
STF manteve a autonomia política do Distrito Federal.
Sigmaringa
Seixas nunca foi um fenômeno de votos. Ele perdeu a tentativa de se reeleger em
2006 e nem arriscou lançar-se candidato em 2010 e 2014. Aos amigos, tem dito
que não pretende voltar à vida partidária. Seu negócio é outro: a advocacia.
Sua atuação no caso da Lava Jato demonstra que ele pode preencher parte do
vácuo deixado pelo ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, que tentava construir um
discurso de unidade entre as empreiteiras investigadas e, ao mesmo tempo,
poupar o governo.
Paralelamente,
Sigmaringa continua construindo pontes. Na semana passada, Cristovam Buarque
procurava um interlocutor para sugerir uma proposta insólita: que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva procurasse o antecessor Fernando
Henrique Cardoso para amenizar o clima de acirramento político. Só conseguiu
pensar em um nome: o de Sigmaringa Seixas. "Eu disse que é algo que faz
sentido, mas é maluco'. Ele respondeu: 'Não é maluco, não'", diz o
senador.
Fonte: Por Gabriel
Castro e Marcela Mattos, de Brasília. Foto: Beto Barata/Estadão Conteúd