Afirmação de Rodrigo Janot consta de um documento enviado
neste mês ao Supremo Tribunal Federal, que analisa inquérito sobre a ação
combinada de empresas multinacionais para obter contratos de trens e metrô em
São Paulo de 1998 a
2008
Janot pediu ao Supremo conteúdo do deppimento à PF do
delator do cartel, Everton Rheinheimer
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
afirmou, em um parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal, que há "fortes
indícios de existência do esquema de pagamento de propina pela multinacional
alemã Siemens a agentes públicos vinculados ao Metrô de São Paulo". ...
A afirmação consta de documento enviado em 7 de
janeiro ao ministro Marco Aurélio Mello, relator do inquérito 3815, que apura
ação de cartel no setor de trens e metrô em São Paulo entre 1998 e 2008 -
governos Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra, todos do PSDB.
Nesse documento em que Janot faz as considerações,
ele pede a Marco Aurélio que envie à Procuradoria-Geral o depoimento do
ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer, único elemento que justifica a
manutenção do caso no Supremo por
citar envolvimento de quatro deputados
federais, que têm foro privilegiado, com o cartel.
Em delação premiada, Rheinheimer acusa de receberem
propina os hoje secretários estaduais e deputados federais licenciados Edson
Aparecido (PSDB), José Aníbal (PSDB) e Rodrigo Garcia (DEM), assim como o
deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP).
Quando os autos foram encaminhados a Janot, para que
ele desse seu parecer a respeito da manutenção ou não do caso no âmbito do
Supremo, Marco Aurélio não enviou a delação. Por isso Janot escreveu a Marco
Aurélio e fez as considerações a respeito da gravidade do caso. O parecer do
procurador-geral da República sobre a continuidade da investigação no Supremo
ainda não foi dado.
No documento em que pede o conteúdo da delação, Janot
disse que precisava dela para poder opinar, uma vez que não havia como
apreciar, "com a segurança devida, os elementos que supostamente indiquem
a participação de detentores de prerrogativa de foro nas práticas
delitivas".
Em 11 páginas, ele faz um resumo dos principais
trechos do inquérito. Lista as denúncias de cartel e corrupção envolvendo a
Siemens e a multinacional francesa Alstom nos setores elétrico e
metroferroviário, relata as quebras de sigilo bancário e fiscal que constam do
processo, os depoimentos e os bens já bloqueados.
Para fundamentar a afirmação de que "há fortes
indícios de corrupção", Janot usa três dos depoimentos colhidos pela
Polícia Federal. Um deles é o do ex-diretor da CPTM Benedito Dantas Chiaradia,
que disse ter ouvido de pessoas do setor metroferroviário relatos de pagamento
de propina a agentes públicos. Segundo Chiaradia, os relatos davam conta de que
o consultor Arthur Teixeira intermediava a formação de cartéis e viabilizava a
propina.
O procurador usa o relato do secretário de
Transportes Metropolitanos de São Paulo, Jurandir Fernandes, titular da pasta
durante parte do período do cartel, que disse ter ficado "indignado"
com a descoberta de que o ex-diretor da CPTM João Roberto Zaniboni tinha
dinheiro não declarado em contas bancárias na Suíça. Fernandes declarou que
Teixeira é lobista do setor metroviário.
Janot destaca o depoimento do doleiro Marco Antonio
Cursini, que contou ter feito diversas operações de dólar cabo para Teixeira,
por meio das quais internalizava valores de contas dele na Suíça. O procurador
diz que documentos da Suíça apontam o trânsito de valores por paraísos fiscais,
"tudo para ocultar a origem e destino das transações financeiras
ilícitas".
O ministro Marco Aurélio sempre decide pelo
desmembramento dos casos com detentores de foro privilegiado. Com isso, apenas
os quatro citados com foro devem continuar a ser investigados em Brasília. A
investigação contra os outros citados voltaria a ser feita por São Paulo.
"Tenho procedimento que é único. Na ação penal 470 (mensalão) insisti até
o fim pelo desmembramento." Ele prega a publicidade. "Neste caso os
autos correm na totalidade em segredo de Justiça. Não cabe o sigilo linear, mas
sobre peças. O restante do inquérito deve correr com publicidade, inclusive
quanto ao lançamento dos nomes dos investigados. É um erro a imprensa não ter
acesso."
Fonte: Dida Sampaio/Estadão - 19/01/2014