A reação dos deficientes
visuais privados de entender a mensagem da presidente da República em 21 de
junho de 2013 reabre velha ferida para a qual se exige resposta imediata.
Na oportunidade, Dilma
usou cadeia nacional de rádio e televisão para dar satisfação aos milhões de
manifestantes que protestavam nas ruas das principais cidades de norte a sul do
país.
O pronunciamento foi
apenas oral. Quem não tinha a capacidade de ouvir só teve a alternativa de
adivinhar a fala pelo movimento dos lábios. É como se não existissem recursos
aptos a incluir os 9 milhões de surdos na normalidade da comunicação. Mas
existem. Além da legenda, que só atende os alfabetizados, há intérpretes especializados
na
língua brasileira de sinais (Libras). O Ministério Público abriu inquérito
para investigar a discriminação frequentemente observada contra essa parcela da
população. ...
Na verdade, a
acessibilidade não constitui problema apenas dos privados do sentido da
audição. É bem mais geral. Outros brasileiros com necessidades especiais também
sofrem ao exercer o legítimo direito de cidadão. Faltam sinais sonoros para
avisar aos cegos a hora de atravessar a rua. Ônibus não baixam o degrau para
facilitar a entrada ou a saída de passageiros idosos ou com dificuldade de
locomoção.
Não só. Prédios, mesmo
públicos, não dispõem de rampas de acesso nem contam com elevador. As calçadas
impossibilitam o vai e vem de pedestres e cadeirantes. Além de buracos e
entulhos ao longo do percurso, muitas interrompem o caminho com vasos de
plantas postos em frente de residências ou de casas comerciais. Quedas e
acidentes tornam-se rotina em espaços tão hostis.
A realidade externa das
pessoas com alguma necessidade especial lembra canção de Chico Buarque: “O
tempo passou na janela / só Carolina não viu”. Foi o que aconteceu no Brasil.
As autoridades desconheceram — e teimam em desconhecer — mudança no
comportamento da sociedade. Ficaram no passado distante os tempos em que as
famílias escondiam os filhos ou parentes com qualquer característica que os
diferenciava da maioria. Isoladas, eram pessoas sem visibilidade e sem
direitos.
Hoje a mentalidade é
outra. Eles estão nas ruas, nas escolas, nos concursos, nos empregos. Exercem a
cidadania. Votam e pagam impostos. Têm direitos e querem exercê-los. O Estado
precisa agir — fazer cumprir a Constituição e as leis. A falta de compromisso é
resquício caduco. Segundo o Censo de 2010, 24% da população têm alguma
necessidade especial. Excluir um em cada 4 brasileiros é bancar a Carolina.
Envergonha o Brasil moderno.
Fonte:
Correio Braziliense - 12/01/2014