Partido de esquerda e
ex-presidente são autores de propostas que taxam patrimônios pessoais elevados.
Projetos estão prontos para ir a plenário, mas parlamentares não têm interesse
em votá-los
Donos de discursos com divergências insuperáveis, o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e o Psol concordam em um ponto: é preciso criar o Imposto sobre
Grandes Fortunas, único dos sete tributos federais previstos na Constituição de
1988 que ainda não saiu do papel. FHC e a bancada do Psol na Câmara são autores
de projetos de lei complementar que preveem a taxação sobre grandes
patrimônios. As duas propostas estão prontas para votação no plenário da
Câmara, à espera somente de uma decisão política para entrar na pauta. Além
delas, há pelo menos outros 12 propostas tratando do assunto.
Nenhuma, porém, em estado tão avançado de tramitação
quanto a de Fernando Henrique. O texto, apresentado em 1989 pelo então senador
paulista, foi aprovado no Senado e encaminhado à Câmara naquele mesmo ano.
Passou pelas
comissões da Casa, mas estacionou no plenário em 2000. Presidente
da República por oito anos, entre 1995 e 2002, o tucano não mobilizou seus
aliados para retirar a proposta de taxação das grandes fortunas da gaveta.
O projeto do Psol foi
apresentado em 2008 pelos três integrantes da bancada à época – os ainda hoje
deputados Chico Alencar (RJ) e Ivan Valente (SP) e a
ex-deputada Luciana Genro (RS). O texto foi aprovado pela Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ), mas, por falta de consenso, acabou não sendo
votado pela Comissão de Finanças e Tributação (CFT). Está pronto para votação
em plenário desde setembro do ano passado.
Pela proposta do Psol, serão taxados em 1% aqueles
que têm patrimônio entre R$ 2 milhões e R$ 5 milhões. A taxação aumenta para 2%
sobre aqueles cujos bens estejam estimados entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões.
Para quem tem entre R$ 10 milhões e R$ 20 milhões, a taxação prevista é de 3%.
De R$ 20 milhões a R$ 50 milhões, a mordida será de 4%. E para os felizardos
que têm acima de R$ 50 milhões, a cobrança será de 5%.
Ainda de acordo com o projeto do Psol, estariam
isentos da taxação objetos de arte ou coleção, segundo percentuais fixados em
lei; instrumentos utilizados para trabalho assalariado ou autônomo até R$ 300
mil; e outros bens considerados por lei como de relevante valor social,
econômico ou ecológico.
Um dos autores da proposta, Chico Alencar acredita
que a matéria só será votada se houver “bom senso e o mínimo de sentimento de
justiça tributária” entre os congressistas brasileiros. “É um projeto ameno,
moderado. Não é um projeto da esquerda radical. É um projeto da sensatez
radical”, afirmou o parlamentar fluminense.
Imposto de Renda
Contudo, Psol e FHC desafinam em alguns pontos. Além
de o projeto de FHC ter alíquotas e faixas de tributação desatualizadas, por
conta do longo tempo de espera, os deputados do Psol também discordam do fato
de a proposta do tucano permitir que o valor pago a título de Imposto sobre
Grandes Fortunas possa ser deduzido do Imposto de Renda.
“Isto é descabido, uma vez que o objetivo é
justamente aumentar a tributação sobre as camadas mais ricas da população, e
que possuem capacidade contributiva”, justificam os parlamentares. “Antes de
assumir o governo, FHC era o príncipe dos sociólogos. Depois, virou o sociólogo
dos príncipes”, alfinetou Alencar.
“Despropósito”
Para o deputado Antonio Carlos Mendes Thame
(PSDB-SP), a ideia de se criar um imposto sobre grandes fortunas só teria
sentido se o dinheiro arrecadado com o novo tributo servisse para aliviar a
carga tributária que recai sobre a parcela mais pobre da população.
“Temos uma tributação regressiva, em que o pobre paga
proporcionalmente mais imposto”, explica. “Só criar mais um imposto seria um
despropósito”, analisa o tucano, ressaltando que há dez anos a carga tributária
correspondia a 32% do Produto Interno Bruto (PIB). Atualmente, complementa
Thame, ela está em 40%. “O Brasil é um dos países que mais cobram imposto no
mundo”, resume.
O parlamentar paulista ainda ressalta que é preciso
cuidado para que um eventual novo imposto não taxe “médias fortunas”, o que
iria “esfolar” a classe média brasileira. Para ele, fundamental é diminuir a
taxação no consumo, nas exportações e bens de capital.
Bandeira histórica do PT, a iniciativa nunca chegou a
ser tratada como prioridade nos governos Lula e Dilma. Em 2008, lideranças do
partido tentaram incluir o assunto na proposta de reforma tributária, relatada
à época pelo deputado Sandro Mabel (PMDB-GO). A taxação acabou excluída do
relatório do parlamentar goiano. A reforma também naufragou.
Fonte: Congresso em Foco