Pelo menos quatro sessões foram encerradas
por falta de parlamentares. Deputados ganham R$ 840 por sessão; Câmara realiza
três por semana
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Sede da Câmara Legislativa do Distrito Federal localizada na Praça Municipal. |
Pelo menos quatro sessões da
Câmara Legislativa do Distrito Federal encerradas por falta de quórum neste ano
tiveram a lista de presença assinada por até 23 dos 24 deputados da Casa. As
sessões acabaram em menos de 20 minutos e se resumiram à leitura do expediente,
rito necessário para que os projetos de lei comecem a tramitar.
As sessões encerradas por
falta de quórum ocorreram nos dias 12 de fevereiro, 19 de março, 1º e 16 de
abril. ...
As sessões duraram,
respectivamente, 17, 7, 4 e 5 minutos. Nesses dias, no máximo 5 dos 24
deputados distritais acompanhavam o rito em plenário e, por isso, nem os
debates e pronunciamentos foram abertos. O quórum mínimo para abertura de
debates é de seis deputados.
Segundo o regimento da Casa,
as sessões ordinárias acontecem sempre às terças, quartas e quintas-feiras, a
partir das 15h. A presença é obrigatória, e a ausência
não justificada resulta
no corte de ponto dos distritais.
Com o salário de R$ 25,2 mil
em vigor desde janeiro, cada falta implica em um desconto de R$ 840 no
vencimento. Com a assinatura na lista, a presença é considerada válida mesmo
que o parlamentar não permaneça em plenário para a sessão.
O G1 ouviu 22 dos 24 deputados
sobre o assunto. Os parlamentares faltosos apresentaram explicações diferentes,
mas foram unânimes ao afirmar que a atividade legislativa "não se resume
ao plenário" e que "a agenda de um deputado prevê uma série de outros
compromissos". Dizem, também, que o Regimento Interno da Câmara permite
que a manobra aconteça. A reportagem não conseguiu posicionamento dos deputados
Dr. Michel (PP) e Raimundo Ribeiro (PSDB).
"O deputado não é
obrigado a estar, pode assinar e sair. O quórum se dá com a presença física,
não com a assinatura. Eu não concordo, mas é o que está no regimento", diz
Reginaldo Veras (PDT). Rafael Prudente (PMDB) afirma que a participação em
plenário depende do "bom senso" de cada deputado. "Como o
regimento permite, pode ser que o deputado chegue e a sessão ordinária já tenha
acabado", diz.
Para Rodrigo Delmasso (PTN), o
fechamento quase instantâneo das sessões impede que alguns parlamentares voltem
do cafezinho ou de pequenos atendimentos. "Já aconteceu de eu sair, passar
cinco minutos fora atendendo um telefone, e a sessão ter terminado na volta. Já
aconteceu de eu chegar uns minutos atrasado e a sessão ter terminado."
Já aconteceu de eu sair,
passar cinco minutos fora atendendo um telefone, e a sessão ter terminado na
volta. Já aconteceu de eu chegar uns minutos atrasado e a sessão ter
terminado"
Deputado Rodrigo Delmasso
(PTN)
Congresso
No Congresso Nacional,
deputados e senadores têm a presença contabilizada por uma espécie de
"ponto eletrônico". Segundo a consultora legislativa da Câmara
Federal Luciana Botelho, basta que o parlamentar esteja na Casa, em qualquer
lugar do prédio principal ou dos anexos, para que seja considerado presente.
"A presença para abrir a sessão é verificada no sistema eletrônico de
entrada e saída", diz.
O quórum em plenário só é
verificado se houver votação prevista para aquela sessão. Daí, é preciso que a
maioria dos parlamentares (257 dos 512 deputados, no caso da Câmara) passem
pelo plenário e registrem presença. No momento da votação, esse número é
conferido novamente, de acordo com o Regimento Interno da Câmara dos Deputados.
A presidente da Câmara
Legislativa do DF, deputada Celina Leão (PDT), afirma que o sistema
informatizado já foi encomendado e deve ser instalado até o fim do ano. Com
isso, o distrital estará "presente" assim que entrar na garagem,
mesmo que não visite o plenário. O quórum só será medido para abrir os
pronunciamentos e, se houver acordo, na abertura das votações.
"Isso já aconteceria
aqui, mas a Casa não se muniu de tecnologia. A gente já solicitou, é um
processo licitatório. Se a Casa não conseguir fazer, vamos ter que
contratar", declara.
Quando todo mundo disputou a
eleição, sabia que as sessões deliberativas são terça, quarta e quinta. Eu não
marco nada no horário da sessão, a não ser quando peço audiência a um ministro,
por exemplo. Mesmo assim, venho aqui e digo que estou saindo"
Deputado Chico Vigilante (PT)
Para Celina, a automatização
do registro de presença não deve ter impacto negativo nas sessões. "A
produtividade não pode ser medida em quatro sessões, mas no contexto global das
atividades. Foi a primeira vez, por exemplo, que a Câmara fez uma sessão na
sexta-feira. Estamos aproveitando as quintas-feiras, em que o quórum é menor,
para fazer comissões gerais", diz.
No quarto mandato consecutivo
como distrital, Chico Leite (PT) diz que a assinatura de chamada virou
formalidade e não serve mais para medir a participação dos deputados.
"Embora não seja o único trabalho do parlamentar, é preciso que ele esteja
em plenário às terças, quartas e quintas. Propus esse debate há alguns anos e
não tive êxito".
Manobra
Parlamentares ouvidos pelo G1
afirmam que a ocorrência de “sessões-relâmpagos” encerradas por falta de quórum
está ligada ao rito diário de abertura e fechamento dos trabalhos. O
funcionamento da sessão ordinária está previsto no artigo 109 do Regimento Interno,
e também é baseado nas leis internas da Câmara Federal.
Segundo o regimento, a
abertura da sessão é prerrogativa do presidente da Casa. Se ele não estiver em
plenário, é substituído em ordem "pelo vice-presidente, secretários e
suplentes ou, finalmente, pelo deputado mais idoso, entre os de maior número de
legislaturas". Das quatro sessões-relâmpagos, apenas uma foi comandada
pela presidente Celina Leão.
"Sempre chego às 15h ou
um pouco antes e não tem ninguém. Aí a gente sobe no gabinete, atende alguém e
quando está lá em cima, ele [quem comanda o plenário] abre [a sessão]. Abre,
não suspende e já encerra, sem avisar ninguém", diz Joe Valle (PDT).
Estreante na Câmara, o
deputado Lira (PHS) diz não entender a abertura das sessões sem o quórum regimental.
"Sempre fiquei até o final, só me retiro quando é definida a falta de
quórum. Na única vez em que saí pra resolver uma emergência, por 15 minutos, na
volta já tinha encerrado. Eu não sei o que se passa na cabeça de quem tá
presidindo, não sei as razões. Estando no prédio, eu geralmente desço para
votar", afirma.
Responsável por presidir duas
das quatro sessões, o líder da oposição Chico Vigilante (PT) nega que haja
manipulação de quórum e diz que falta compromisso por parte dos colegas.
"Quando todo mundo disputou a eleição, sabia que as sessões deliberativas
são terça, quarta e quinta. Eu não marco nada no horário da sessão, a não ser
quando peço audiência a um ministro, por exemplo. Mesmo assim, venho aqui e
digo que estou saindo."
Quando existe uma sessão
ordinária sem nada pra acrescentar, em que os deputados só vão discursar, não
compensa. Eu chego lá, assino e pergunto: 'Qual é o debate hoje?'. Se não for
nada da minha área, vou para o gabinete atender. O deputado tem que sujar o
sapato, não adianta ficar em plenário"
Deputado Wellington Luiz
(PMDB)
Presidente da Câmara entre
2013 e 2014, o distrital de quinto mandato Wasny de Roure (PT) diz que as
ausências causam prejuízo à atividade parlamentar e se tornaram sistemáticas ao
longo dos anos. "Eu, como presidente, teimei muito para fazer funcionar.
Até no colégio de líderes as ausências eram sistemáticas. Sei que os deputados
têm muita agenda, mas não pode comprometer o debate, é desonesto."
Correligionário de Vigilante,
Wasny defende que o presidente da Casa tenha prioridade no comando das sessões.
"Às vezes, o deputado está apreensivo, quer chegar logo e sair logo.
Continuo achando que cometemos um grande erro ao não participar das sessões. É
preciso ter paciência com o tempo", afirma, em referência à tolerância de
30 minutos prevista no regimento para o início da sessão ordinária (entre 15h e
15h30).
Vice-presidente da Câmara, a
deputada reeleita Liliane Roriz (PRTB) diz não acreditar em
"sabotagem". "Eu não participo do colégio de líderes, e depende
muito da condição deles. O acionamento dos deputados foge do meu controle. Os
parlamentares ficam à disposição do governo para debater. Cada um tem a sua
base eleitoral, o seu segmento", diz.
Outras tarefas
Distritais que assinaram a chamada
e não aparecem nas atas taquigráficas afirmaram à reportagem que não veem
contradição nos dados. O distrital Wellington Luiz (PMDB) vai além, e diz
defender a ausência quando não há acordo para votação.
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Morador discursa em sessão parlamentar na Rodoviária do Plano Piloto (Foto: Mateus Rodrigues/G1)
Morador discursa em sessão parlamentar na Rodoviária do Plano.
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"Quando existe uma sessão
ordinária sem nada pra acrescentar, em que os deputados só vão discursar, não
compensa. Eu chego lá, assino e pergunto: 'Qual é o debate hoje?'. Se não for
nada da minha área, vou para o gabinete atender. O deputado tem que sujar o
sapato, não adianta ficar em plenário", afirma.
Luiz diz ter sido criticado no
mandato anterior por faltar a muitas sessões. "Se você não assina, apanha
da imprensa porque é faltoso. Se assina e vai para o gabinete, você apanha. Não
vejo como imoral. Os debates duram três, quatro horas, imagina quantas comunidades
você poderia visitar nesse tempo?"
Telma Rufino (PPL) também
credita as sessões-relâmpagos aos atendimentos em gabinete. "Pra você ter
uma ideia, por mais que eu marque para receber a comunidade pela manhã, as
pessoas chegam ao gabinete no meio da tarde e subo para atender enquanto
entramos na pauta do dia. As pessoas têm pressa, muitas vezes estão faltando ao
trabalho e a compromissos importantes. Não dá para deixar esperando."
Para Agaciel Maia (PTC), as
sessões sem quórum não atrapalham o ritmo da Câmara. "A parte que é mais
importante é o problema da eficácia. Temos alguma matéria importante para a
população que a Câmara não está votando por falta de quórum? O resultado de
votação da Câmara é satisfatório? O parlamentar pode enganar a ele mesmo, mas a
população ele nunca consegue enganar", diz.
Ricardo Vale (PT) diz que a
prática não é recorrente. "Vez ou outra pode acontecer, mas acho que só
presenciei essa situação uma ou duas vezes desde que assumi o mandato",
afirma. Sandra Faraj (SD) adota o mesmo discurso: "Na verdade, essa
legislatura tem sido muito produtiva. A gente não pode achar que o trabalho do
parlamentar se limita dentro do plenário. Muitas vezes a gente está em uma
comissão, uma reunião de liderança".
Outros deputados ouvidos pelo
G1 evitam analisar o cenário coletivo. "Não sei te dar nenhuma explicação
[sobre a lista de presença]. Eu sei que eu estava na Casa e pronta para o
quórum", diz Luzia de Paula (PEN), sobre uma das sessões encerradas por
falta de quórum que tinha o nome dela entre os presentes.
De um lado, insatisfeitos com
a própria Câmara, que não pauta os projetos dos deputados, só os do Executivo.
De outro, insatisfeitos com o Buriti, que manda tudo com urgência e passa na
frente. É uma obstrução à forma de tratamento que o governo quer impor à
Câmara"
Deputado Renato Andrade (PR)
"Faço minha parte, vou lá
no plenário. Eu tenho que estar na Câmara no meu horário de trabalho",
afirma Juarezão (PRTB). Líder do governo na Câmara, Julio Cesar (PRB) diz
acreditar na honestidade dos colegas que assinam a lista. "Estou em todas
as sessões, a não ser que esteja licenciado. A maioria fica nos seus gabinetes,
desce para poder dialogar quando é chamado".
Conjuntura
Para alguns deputados, o
problema pode estar no "esvaziamento" da pauta de votações,
ocasionado por problemas na articulação política e pela falta de acordo entre
os líderes partidários.
"Me preocupa o fato de
que alguns somente assinem, e o que vale é a assinatura. Mas não podemos ser
injustos. Pode ser que a sessão não tenha acontecido porque não havia nada
deliberado pelo colégio de líderes", diz Israel Batista, líder pelo PV.
O distrital Robério Negreiros
(PMDB) reforça a importância dos acordos de votação. "O plenário da Câmara
Legislativa não tem chamada como a de um colégio, o trabalho parlamentar é
amplo. Senão, a gente nem precisava ter gabinete. Temos três dias de plenário,
terça, quarta e quinta. Eu mesmo, hoje (quarta, 20), assinei e fiz atendimentos
como estou fazendo até agora, oito da noite", afirma.
Cristiano Araújo (PTB) diz que
os distritais preferem atender as bases eleitorais e, por isso, se recusam a
participar de "rodadas de debate" em plenário. "Se você não tem
agenda no Legislativo e no Executivo, e os projetos de deputados estão presos
nas comissões, cada um vai cuidar de suas bases. Acho difícil que qualquer um
desses 24 deputados esteja à toa", diz.
Renato Andrade (PR) credita as
ausências ao que chama de "insatisfação generalizada" entre os
distritais. "De um lado, insatisfeitos com a própria Câmara, que não pauta
os projetos dos deputados, só os do Executivo. De outro, insatisfeitos com o
Buriti, que manda tudo com urgência e passa na frente. É uma obstrução à forma
de tratamento que o governo quer impor à Câmara", diz.
Fonte: Por Mateus Rodrigues, portal G1DF com fotos
de Mateus Rodrigues/G1 e Ricardo Moreira / G1 - 21/05/2015