As prisões de Joesley Batista e Ricardo
foram os penúltimos atos de Rodrigo Janot à frente do cargo de procurador-geral
O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chega ao fim do mandato com a
credibilidade abalada e uma promessa ainda por cumprir: oferecer a segunda
denúncia contra o presidente Michel Temer, com base na delação premiada do
doleiro Lúcio Funaro, que havia anunciado antes da divulgação da conversa entre
o empresário Joesley Batista e o executivo Ricardo Saud. A imagem foi arranhada
mais uma vez no último sábado, depois de Janot ser flagrado com o advogado da
JBS, Pierpaolo Bottini, que defende Joesley Batista, num boteco de Brasília.
Janot
tem apenas mais sete dias de mandato, que prometem ser bastante turbulentos.
Ontem, a Polícia Federal prendeu Joesley e Saud em São Paulo, por determinação
do ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal
Federal (STF), que acolheu o pedido de prisão de ambos, mas deixou em liberdade
o ex-procurador Marcelo Paranhos Miller, contratado pelo escritório Watanabe e
Associados, até então responsável pelo acordo de leniência da JBS, supostamente
antes de deixar o Ministério Público Federal. Segundo Fachin, apesar da
gravação, as provas de
que Miller atuava a favor da empresa de Joesley quando
era procurador do MP não eram robustas o suficiente para a decretar a
prisão.
Joesley
e Saud se entregaram à Polícia Federal em São Paulo, onde passaram a noite na
carceragem. Hoje, serão transferidos para Brasília, para ser interrogados. A
reação dos ministros do Supremo contra ambos na semana passada foi duríssima,
resultando no pedido de prisão apresentado por Janot e acolhido por Fachin. Mas
o assunto não está resolvido. As sessões da Segunda Turma, presidida pelo
ministro Gilmar Mendes, e do plenário do Supremo, que também deverá tratar do
caso, podem se transformar num verdadeiro pelourinho para Janot.
O
encontro com Bottini acabou por lançar mais suspeitas de envolvimento de Janot
nas negociações da JBS, embora o advogado tenha afirmado que cruzou
“casualmente” com o procurador-geral na capital. “Por uma questão de gentileza,
nos cumprimentamos e trocamos algumas palavras, de forma cordial. Não tratamos
de qualquer questão outra ou afeta a temas jurídicos.” Ambos foram fotografados
sentados numa mesa de fundos, ao lado de uma caixa de cerveja. Conversaram por
mais de 20 minutos.
Suspeitas
O
pedido de prisão de Miller era inevitável, uma vez que Janot precisava desfazer
as suspeitas de conluio com o ex-procurador, mas, aparentemente, foi
precipitado. É o que dá a entender a decisão de Fachin: “Ainda que sejam
consistentes os indícios de que pode ter praticado o delito, de exploração de
prestígio e até mesmo de obstrução às investigações, não há, por ora, elemento
indiciário com a consistência necessária à decretação da prisão temporária, de
que tenha, tal qual sustentado pelo Procurador-Geral da República, sido
cooptado pela organização criminosa”, afirmou o ministro.
Fachin
considerou que há indícios de que Joesley e Saud, na conversa em 17 de março de
2017, tenham omitido informações sobre a participação de Miller nas negociações
do acordo de delação. Para o ministro, pode haver justa causa para a rescisão
dos acordos de delação premiada que tinham dado, até agora, imunidade completa
a Joesley e a outros colaboradores da JBS no processo da Lava-Jato. Por ordem
de Fachin, as prisões foram feitas com “a máxima discrição e com a menor
ostensividade” para preservar as imagens dos presos, evitando expô-los.
Informações
A
grande incógnita no caso é a situação de Miller, cuja defesa divulgou nota na
qual afirma: “Não tinha contato algum com o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, nem atuação na Operação Lava-Jato desde, pelo menos, outubro de
2016. Nunca atuou na Operação Greenfield, nem na Procuradoria da República no
Distrito Federal”. Miller alega que pediu exoneração em 23/2/2017, tendo essa
informação circulado imediatamente no MPF.
O
bombardeio contra Janot ontem ganhou mais um personagem. O advogado Antônio
Carlos de Almeida Castro, o Kakay, foi contratado pela JBS e assumiu a defesa
atirando contra Janot: “Entendo que os delatores, ao assinarem a delação,
cumpriram rigorosamente tudo o que lhes era imposto. Não pode o Dr. Janot agir
com falta de lealdade e insinuar que o acordo de delação foi descumprido. Os
clientes prestaram declarações e se colocaram sempre à disposição da Justiça.
Este é mais um elemento forte que levará à descrença e à falta de credibilidade
do instituto da delação”.
Mas
o grande desafeto de Janot é Gilmar Mendes. A defesa do presidente Michel Temer
pediu para que Fachin determine a suspensão da nova denúncia e de outros
inquéritos contra ele, até que terminem as investigações sobre a omissão de
fatos na delação premiada. “O presente caso, ou nos demais que eventualmente
possam surgir, a atuação parcial, conflitante e passional de autoridades e o
descrédito de colaboradores comprometerão a rigidez de qualquer processo, em
verdadeira afronta ao Estado Democrático de Direito”, argumenta o criminalista
Antônio Mariz.
Fachin
já anunciou que o assunto será decidido pelo plenário da Corte, o que deixará
frente a frente Janot e Gilmar. Na semana passada, o ministro fez um duro
ataque a Janot: “O procurador-geral da República, mais uma vez, deu curso à sua
estratégia de delinquente e fez uma chantagem com o Supremo Tribunal Federal”.
A semana está apenas começando.
fonte: Correio Braziliense