O deputado Raad Massouh (PPL) foi cassado na
quarta-feira (30), por 18 votos favoráveis. Acusação: desviar recursos públicos
através de emenda parlamentar. Mas como é que funciona este negócio de emenda
parlamentar? Funciona para muitos deputados como um negócio.
No caso de Raad, o
dinheiro da emenda seria para realização do 1º Festival Rural Ecológico de
Sobradinho, em 2010. Parte dos R$ 100 mil teriam sido desviados. A investigação
aponta que R$ 47 mil se perdeu no caminho. ...
Emendas são apresentadas
pelos parlamentares à proposta de orçamento enviada
pelo Governo. Os deputados
tem a obrigação de decidir todo o orçamento. E ainda lhe cabem a prerrogativa
de apresentar emendas individuais.
Cada distrital tem um
valor para emendas, de R$ 13,5 milhões. É dinheiro que pode ser destinado a uma
quadra de esporte, posto de saúde, nova escola ou infraestrutura.
Na Câmara Legislativa,
emenda virou uma festa. Literalmente. Vamos aos dois últimos anos. Em 2011, os
deputados apresentaram, ao todo, 778 emendas ao orçamento de 2012. A área de
eventos, principalmente festas e comemorações nas cidades, recebeu 24,1% das
emendas.
Os recursos destinados à
área somaram R$ 71,94 milhões, enquanto o valor total é de R$ 298,4 milhões
(excluindo-se as apresentadas pela Mesa Diretora).
Das 778 emendas dos
parlamentares, as áreas de cultura (283) e desporto e lazer (110) receberam bem
mais atenção do que setores como educação (51) e saúde (18).
Em 2012 não foi muito
diferente. Os distritais aprovaram para o orçamento deste ano R$ 46,8 milhões
para a Secretaria de Cultura. Em segundo ficou a Secretaria de Obras com R$
44,2 milhões e Educação com R$ 20,7 milhões. Uma festa só.
Somando por setor,
Urbanismo fica em primeiro com R$ 153,7 milhões, ou 47,44% do total das
emendas. Cultura somou R$ 68,4 milhões (21,13%). Deporto e Lazer, onde também
estão incluídas festas e eventos, foi o terceiro com R$ 27 milhões, ou 8,3%.
Sabe quanto recebeu a saúde: R$ 4,3 milhões (1,3%). Piada, né!
Raad caiu por R$ 47 mil.
Em seu discurso falou que o valor era muito pouco para se corromper. É muito
sim. Qualquer real desviado do dinheiro público é muito. O problema é que o
deputado cassado ganhou inimigos, principalmente em sua base eleitoral.
Uma investigação para
valer mostraria que outros deputados usam a mesma prática que Raad. Em 2012
apenas um parlamentar dos 24 da Câmara Legislativa não apresentou emendas para
festas e eventos. Foi o Cabo Patrício (PT). É claro que nem toda emenda será
desviada. Só algumas. Outras são simplesmente desnecessárias.
É muito dinheiro do
contribuinte indo pelo ralo. Isso gera distorções como o valor alto pago ao
cantor Amado Batista no aniversário do Itapoã.
O artista foi contratado
por R$ 400 mil, ou quase três vezes mais do que ele ganha em apresentações pelo
país afora. O administrador da cidade, Donizete dos Santos, foi exonerado. É
apenas um caso entre muitos.
Os parlamentares
deveriam se concentrar em discutir a íntegra da peça orçamentária. As decisões alocativas
são tomadas exatamente na discussão do orçamento. Mas a preocupação está sempre
apenas com as emendas.
O critério utilizado
pelo parlamentar para apresentar as emendas é confessadamente político. O
parlamentar prestigia a base eleitoral, mandando para lá um posto de saúde, uma
calçada ou uma quadra de esportes.
Com as emendas, o
parlamentar se anuncia como um “realizador de obras”. Coloca faixas na cidade e
solta releases aos jornais assumindo a autoria daquele posto de saúde,
asfaltamento ou nova escola. Mesmo que isso nada tenha a ver com a atividade
parlamentar.
O fato de o parlamentar
apresentar a emenda não significa que o dinheiro será liberado. O orçamento é
autorizativo (e não impositivo). O Governo só libera o dinheiro das emendas para
quem se comportar bem no parlamento.
Ao lado dos cargos
indicados pelos parlamentares, é o maior instrumento de pressão política do
Governo. Votar sempre com o Executivo é a senha para ter mais recursos
liberados. É uma espécie de mimo para os que têm bom comportamento parlamentar.
Alguns deputados nessa e
em outras legislaturas são acusados de vender as emendas. Aqui no Distrito
Federal e Brasil afora. Esta é a parte não republicana das emendas. Alguns
deputados ficam com parte do dinheiro das emendas. Embolsam, simplesmente.
Os deputados vendem as
emendas. Negociam uma comissão com os empreiteiros que estão na ponta das obras
ou com os produtores de festas e eventos. As licitações são fraudadas para que
haja um compromisso de devolução de parte do valor para o parlamentar
responsável pelas emendas.
Ganham todos: governo
que tem sua base controlada; deputados que engordam as contas bancárias e levam
obras para sua base eleitoral; e as empresas que ganham contratos.
Só quem perde é o povo.
É a institucionalização da compra dos parlamentares, que corrompe e é
corrompido no mesmo ato. Raad é um detalhe.
Fonte: Blog do Callado - 02/11/2013