quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Suspeito de receber propina, ex-diretor da CPTM turbinou contratos

Chefe de setor de manutenção assinou aditamentos durante governos tucanos com empresas acusadas de cartel do setor metroferroviário.

Suspeito de receber propina em contas da Suíça, o ex-diretor de operações e manutenção da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos João Roberto Zaniboni assinou cinco contratos de aditamentos com as multinacionais acusadas de integrar o cartel de trens. Os acordos foram fechados pelo engenheiro entre outubro de 2000 e dezembro de 2002, nos governos tucanos de Mário Covas e Geraldo Alckmin. ...
 

Os aditamentos elevaram gastos da estatal em R$ 11,6 milhões, em valores da época. Na mesma ocasião, segundo o Ministério Público da Suíça. Zaniboni recebeu "numerosos pagamentos" que somaram US$ 836 mil na conta Milmar, de sua titularidade, no Credit Suísse, em Zurique.

Promotores e procuradores que rastreiam contratos de estatais paulistas avaliam que os extratos bancários indicam o primeiro caso concreto de
corrupção na grande investigação sobre o alcance dos casos Alstom e Siemens - multinacionais sob investigação por formação de cartéis para obter a supremacia de licitações da CPTM e no Metrô, no período de 1998 a 2008.

Um dos aditamentos que Zaniboni subscreveu, em 20 de dezembro de 2002, fez subir em R$ 4,13 milhões contrato com a Alstom para prestação de serviços de revisão geral com fornecimento de materiais de 29 trens. O valor original do contrato, que fora fechado em 21 de agosto de 1998, saltou de R$ 19,49 milhões para R$ 23,62 milhões.

No mesmo dia em que aditou o contrato da Alstom, Zaniboni fez outros dois acordos, um com a Inepar e o outro com a Bombardier - o primeiro representou acréscimo de R$ 3,08 milhões, o segundo de R$ 3,13 milhões.

A investigação mostra o caminho da propina até a conta de Zaniboni. A Alstom fez depósitos na França em favor de duas offshores sediadas no Uruguai, controladas pelos irmãos Arthur Teixeira Gomes e Sérgio Meira Teixeira - suspeitos de terem agido como lobistas e consultores da multinacional.

Os aportes foram realizados entre 22 de setembro de 1999 e 20 de dezembro de 2002. Os ativos de Zaniboni têm origem em propinas que teriam sido pagas ao engenheiro antes dos aditamentos, diz o Ministério Público. "Foi possível comprovar no período entre maio de 2000 e dezembro de 2000 pagamentos isolados dos indiciados Gomes Teixeira e Meira Teixeira a tal João Roberto Zaniboni que foi, entre 1999 e 2003 diretor da CPTM, uma companhia estadual de São Paulo", diz relatório dos investigadores suíços.

Na semana passada, diante da força tarefa de promotores e procuradores, Zaniboni disse que o dinheiro em sua conta na Suíça tem origem em consultoria que alega ter prestado para os irmãos Teixeira. Ele não detalhou exatamente os serviços e afirmou que não possui cópias dos contratos de consultoria.

Defesa. O advogado Luiz Fernando Pacheco, que defende o ex-diretor da CPTM, rechaçou a suspeita de propina. "(Zaniboni) recebeu os valores por serviços efetivamente prestados de consultoria anteriormente à posse na diretoria da CPTM." Pacheco afirma que os aditamentos autorizados pelo engenheiro "foram todos absolutamente legais e têm justificativa plausível por intercorrências no cumprimento dos contratos". O advogado confirmou que Zaniboni não tem cópia dos acordos de consultoria. "Não teve contrato", afirmou.

Alckmin comentou ontem o caso. "Seja funcionário ou ex-funcionário, haverá tolerância zero", disse o governador, segundo quem o ex-diretor da CPTM já havia sido chamado para falar à Procuradoria Geral do Estado, que acompanha o caso do cartel, mas não compareceu. Zaniboni não trabalha mais no governo paulista desde 2003.

A CPTM informou que seu ex-direitor também não compareceu a uma convocação da Corregedoria Geral da Administração. "Por isso, será convocado novamente", diz a companhia. "Quanto ao trabalho do Ministério Público, a CPTM o acompanha de perto e tem colaborado."

A Alstom informou que "está prestando todos os esclarecimentos para as autoridades competentes pelas investigações". A Siemens destaca que partiu dela a iniciativa de denunciar o cartel por meio do acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do governo federal que regula a concorrência no País. O acordo de leniência, no qual a Siemens tenta reduzir futuras sanções admitindo irregularidades, foi fechado em maio deste ano.

Suíça pediu busca em residência, mas foi ignorada

Promotores suíços pediram às autoridades brasileiras que realizassem buscas na residência do ex-diretor da CPTM João Roberto Zaniboni. A solicitação ocorreu em fevereiro de 2011, ao Ministério Público Federal, no âmbito de uma investigação de polícia criminal instaurada em Genebra, em outubro de 2008, contra Zaniboni e os irmãos Arthur Gomes Teixeira e Sérgio Teixeira, lobistas da Alstom, por suspeita de lavagem de dinheiro e corrupção.

“Consta dos resultados obtidos até agora que há uma suspeita que companhias do grupo francês Alstom em São Paulo teriam corrompido, com a cumplicidade de cidadãos brasileiros, funcionários públicos, no contexto da atribuição de contratos efetuados pela CPTM”, assinalou o procurador federal suíço Stefan Lenz.

Em “pedido de auxílio Judiciário Internacional em matéria penal”, Lenz requereu os interrogatórios de Zaniboni, dos lobistas e ainda de José Amaro Pinto Ramos.

O procurador suíço insistiu em uma inspeção na casa do exdiretor da CPTM. “Solicita-se que se efetue particularmente no domicílio de Zaniboni uma busca e se apreenda quaisquer documentos relacionados com o presente processo.”

O pedido, porém, não foi atendido. O MP Federal confirmou que não houve buscas na casa de Zaniboni porque naquele momento a medida poderia prejudicar a investigação sobre o caso Alstom no Brasil.

O procurador suíço apontou para as offshores Gantown Coulting SA e GHT Consulting SA, controladas pelos Teixeira. “As análises de fluxos efetuadas na Suíça revelaram que a partir de contas que estas duas pes- soas mantêm ou mantinham na Suíça fundos foram transferi- dos a Zaniboni. Há uma forte suspeita de que esses pagamen- tos foram efetuados em relação com a atribuição de contratos relativos a projetos de transpor- te pela CPTM à Alstom.” F.M.

Por Fausto Macedo
Fonte: Jornal Estado de São Paulo - 17/10/2013