Na acirrada briga pela
liderança do PMDB na Câmara, o deputado Sandro Mabel (GO) não é o único candidato
com problemas na Justiça. Considerado um dos favoritos para liderar a segunda
maior bancada da Casa, ao lado do próprio Mabel, o deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF). Num
deles, o Inquérito 2984,
foi denunciado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, por usar,
segundo a acusação, documentos falsos na tentativa – bem sucedida até o ano
passado – de barrar uma
investigação do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do
Rio de Janeiro sobre irregularidades atribuídas à sua gestão no comando de uma
estatal fluminense. O caso é relatado no Supremo
pelo ministro Gilmar Mendes, que ainda não se posicionou sobre o parecer
enviado pelo procurador-geral da República, apresentado há dois anos. O
deputado argumenta que não sabia que os documentos apresentados por ele eram
falsos e diz que foi vítima de um estelionatário. Ele nega, ainda, ter ocorrido
irregularidades na sua passagem pela direção da Companhia de Habitação do
Estado do Rio de Janeiro (Cehab). ...
Os
argumentos de Eduardo Cunha não convenceram Gurgel, que o denunciou por dois
crimes: usar documento falso e fraudar papéis. No inquérito, ao qual oCongresso
em Foco teve
acesso, Gurgel diz que o deputado foi o “único favorecido” com a falsificação.
O caso aguarda relatório e voto de Gilmar Mendes. Se o STF receber a denúncia,
Cunha se tornará réu em uma ação penal.
O caso
A
denúncia remonta ao período em que Eduardo Cunha serviu ao governo de Anthony
Garotinho no Rio de Janeiro. Na época, entre os anos de 1999 e 2000, ele
presidiu a Companhia de Habitação do estado. O peemedebista deixou o cargo após
denúncias de irregularidades em licitações.
Uma delas envolvia uma empresa representada por um ex-procurador do empresário
Paulo César Farias (já falecido àquela época), que ganhou uma concorrência para
construir casas usando um atestado falso de capital social. PC Farias foi
tesoureiro da campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello, eleito em
1989 pelo Partido da Reconstrução Nacional (PRN), partido ao qual Eduardo Cunha
era filiado naquele ano. Ele participou, inclusive, do comitê eleitoral de
Collor no Rio. As suspeitas passaram a ser investigadas pelo Ministério Público
e pelo TCE do Rio.
Em
2002, Cunha obteve do procurador do Ministério Público Elio Fischberg cinco
documentos que certificavam o arquivamento das investigações naquele órgão
sobre a Cehab. Eram arquivamentos supostamente feitos por promotores e
procuradores do MP sobre a companhia de habitação. Os papéis foram entregues ao
deputado e a seu advogado, Jaime Samuel Cukier. Entretanto, eram falsos, como
comprovaria em 2008 o Instituto de Criminalística Carlos Éboli, da Polícia do
Rio.
Com
os documentos fraudados em mãos, Cunha protocolou um pedido de manifestação no
TCE em 24 de abril de 2002. O relator do caso era o conselheiro Jonas Lopes de
Carvalho, chefe da Casa Civil do governo Garotinho e ex-colega de Cunha naquela
administração. Ele votou pelo arquivamento do processo, ao contrário do que
queriam os inspetores e os procuradores do TCE. Com base nesse voto, o plenário
do tribunal de contas arquivou o processo. No ano passado, o próprio TCE
reabriu as investigações. Hoje, o presidente daquela corte é o próprio Lopes de
Carvalho.
Vítima?
Eduardo
Cunha foi vítima de Fishberg ou utilizou, conscientemente, os documentos
falsos? A Procuradoria-Geral da República assinala a segunda alternativa.
“Existem indícios veementes da autoria do delito pelo denunciado”, escreveram
Gurgel e a subprocuradora Cláudia Sampaio Marques, em réplica à defesa do
deputado.
Os
documentos foram fraudados, conforme a acusação, pelo procurador Elio
Fischberg, que, por causa da falsificação, foi condenado em agosto do ano
passado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio a pagar multa de R$
300 mil ao Instituto Nacional do Câncer e a prestar serviços comunitários. A
acusação é que ele fabricou os papéis, forjou assinaturas de colegas da
instituição e ainda rubricou os documentos com sua assinatura atestando-os como
autênticos. Em 2002, Fishberg fez uma certidão em que diz que, “a pedido do sr.
deputado estadual Eduardo Cosentino Cunha”, existiam investigações sobre a
Cehab arquivadas pelos colegas do Ministério Público. Esse documento também foi
usado pelo deputado e entregue ao TCE.
O
procurador Roberto Gurgel afirma que Eduardo Cunha se associou a Fishberg e ao
advogado Jaime Samuel Cukier para barrar as investigações no TCE. Mas Cukier,
que também foi processado pelo TJ do Rio, acabou absolvido por falta de provas.
Em depoimento sobre o caso em 2007, Eduardo Cunha
disse aos promotores do Ministério Público fluminense que recebeu R$ 5 mil de
Cukier. O pagamento se deve a uma devolução de honorários pagos em virtude de
os procedimentos estarem arquivados.
Pedras no caminho
Apesar
do favoritismo para liderar a bancada do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha não goza
de simpatia do Palácio do Planalto. Em 2007, foi responsabilizado por
integrantes do governo Lula pela derrubada da cobrança da CPMF. A demora do
deputado em apresentar seu parecer à prorrogação da cobrança do chamado
“imposto do cheque” atrasou a votação da proposta na Câmara. O atraso diminuiu
a margem de negociação do governo no Senado, onde não tinha margem folgada de votos.
A
CPMF acabou derrubada pelos senadores naquela que foi considerada a maior
derrota do ex-presidente Lula no Congresso. Integrantes do governo acusaram
Eduardo Cunha de atrasar a votação para pressionar o governo a nomear indicados
por ele para a diretoria de Furnas.
O
deputado também virou desafeto de Anthony Garotinho, seu antigo chefe no
período em que passou pela Companhia de Habitação do Rio de Janeiro. Deputado
pelo PR, Garotinho já questionou na internet a origem do patrimônio de Eduardo
Cunha, que revidou, chamando-o de “quadrilheiro”.
Na
disputa pela liderança do PMDB, Eduardo Cunha tem como principal concorrente o
deputado Sandro Mabel. Como mostrou o Congresso em Foco na semana passada, um juiz da 10ª Vara
Federal de Brasília remeteu ao Supremo inquérito do chamado “golpe da creche” por ver
indícios de formação de quadrilha, falsidade e estelionato na contratação
fantasmas pelo deputado.
Fonte:
Congresso em Foco - 30/01/2013