terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Caixa de Pandora: Arruda e outros réus podem ser inocentados

Vídeo foi gravado na mídia do próprio Tribunal de Justiça e entregue oficialmente aos advogados das partes envolvidas. Conversa entre integrante do Ministério Público e juiz revela que fitas do delator Durval Barbosa foram editadas. Gravidade do diálogo pode levar a anulação de todas as 19 ações penais da Operação Caixa de Pandora

O Blog teve acesso a gravação de uma conversa entre o juiz Atala Correia, então titular da 7ª Vara Criminal de Brasília, e os promotores de Justiça Carlos Augusto Silva Nina e Sérgio Bruno Cabral Fernandes, em 23 de janeiro de 2015, durante audiência de instrução no processo da Operação Caixa de Pandora em que o réu é o ex-deputado distrital Berinaldo Pontes. A gravação revela suposta manipulação das perícias e de provas, além de que todos os vídeos
gravados pelo delator Durval Barbosa foram editados. Além disso, mostra uma ação combinada entre Judiciário e Ministério Público, atropelando ações básicas, como o pedido da Polícia Federal para perícia do aparelho que foi usado para editar. O mesmo pedido foi feito pela defesa do ex-governador José Roberto Arruda.

A gravação rendeu uma ação por parte da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), além de ações impetradas pelos advogados do ex-governador José Roberto Arruda e do ex-deputado Berinaldo Pontes, com base no artigo 5o, LXVIII, da Constituição da República e nos artigos 647 e 648 do Código de Processo Penal. A ação é um habeas corpus, com pedido de liminar, que deve tramitar nos tribunais superiores, já que não foi aceito pelo TJDFT.

A gravação tem cerca de oito minutos. Veja um dos principais trechos:



“L – Ontem avisaram…tá tudo editado.

LF (3min21s) – O Durval tem mais vídeos

(…)

L – Eu não acredito que eles editavam!

(…)

L (4min32,6s) – E a gente tem conver/ é debatido lá, com relação a essa questão das perícias, a gente fica sempre naquela dúvida, de deixar, concordar, pra não alegarem depois nulidade… mas a gente não sabe até onde vai levar isso …

(…)

L1 (JUIZ) – É. Pois éée. Eu tou assim…

(…)

L (4min54s) – Não responda sobre o equipamento. <<fala subposta>>

L1 (JUIZ) (4min55,5s) – Não, não, eu só precisaria dessa, dessa conversa [assim]…

(…)

LF (5min23s) – Se aparecer vai ser uma loucura né? mas os aparelhos já tão aí.

L1 (JUIZ) – Mas eu acho assim, se o aparelho não existe mais…

L (5min27s) – O senhor pode dizer que não tem. <<fala subposta>>

L1 (JUIZ) – Isso aí é uma questão de…

LF (5min28s) – Tem, eu vi o aparelho.”

A conversa foi travada entre promotores de Justiça e o magistrado em exercício na 7a Vara Federal de Brasília, no intervalo da audiência de instrução do processo nº 2014.01.1.051915-4, em que é réu Berinaldo Pontes.

O trecho transcrito foi possível porque o equipamento de gravação permaneceu ligado durante o intervalo da audiência, captando a conversa “informal” entre promotores e juiz, cujo teor compromete a validade de todas as decisões e atos processuais praticados pela autoridade judiciária nas 19 ações penais relativas à operação Caixa de Pandora, todas decorrentes de uma única denúncia, originalmente oferecida pelo Ministério Público Federal junto ao Superior Tribunal de Justiça (Inquérito n° 650/DF, posterior Ação Penal no 707/DF).

A gravação foi submetido a transcrição fonográfica pelo perito em acústica forense Joel Ribeiro Fernandes, sendo preocupante o conteúdo da conversa, que coloca em cheque a imparcialidade do magistrado, o qual ordenou a realização de perícia requerida pela defesa do ex-governador Arruda e depois voltou atrás para indeferi-la.

Imparcialidade também colocada em dúvida do Ministério Público, se atento aos seus encargos constitucionais de fiscal da Lei.

O advogado Nélio Machado, que faz a defesa de Arruda, considera que houve abuso de poder e violações ao devido processo legal. “Na função de fiscal da Lei, tarefa ora assumida pelos impetrantes, diante do inusitado episódio”, diz se referindo a gravação.

Segundo Nélio, pelo teor do diálogo, o Judiciário e Ministério Público, por seus representantes, estão a discutir forma de obstaculizar pedidos realizados pelas defesas referentes à apresentação, em Juízo, dos equipamentos originais utilizados pelo delator Durval Barbosa na gravação de vídeos clandestinos, com a finalidade de serem submetidos a perícia.

O áudio foi franqueado aos impetrantes pelo advogado André Luis Nunes Gomes, patrono de Berinaldo Pontes, o qual declarou que a mídia foi fornecida pelo próprio Cartório da 7a Vara Criminal da Circunscrição Judiciária de Brasília, ora apontada como autoridade coatora.

A defesa de Berinaldo Pontes comunicou o fato ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que apresentou pedido de providências perante o Conselho Nacional de Justiça, no sentido de verificar violação ao dever de imparcialidade do Magistrado e do ferimento de prerrogativa dos advogados de tratamento igualitário entre as partes.

Também foi apresentada ao Conselho Nacional do Ministério Público reclamação disciplinar, autuada sob o nº 20/2016-56, valendo destacar a manifestação do promotor de Justiça Marcelo José de Guimarães e Moraes, membro auxiliar da Corregedoria Nacional, datada de 14 de janeiro de 2016:



“CORREGEDORIA NACIONAL

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR Nº 0.00.000.000020/2016-56

Requerente: CONSELHO FEDERAL DA OAB

Requerido: MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

MANIFESTAÇÃO

Considerando que a presente Reclamação Disciplinar encontra-se formalizada nos termos regimentais (art. 36, RICNMP), manifesto no sentido de que sejam notificados os Reclamados, com cópia integral da RD, para prestar informações em 10 (dez) dias, nos termos dos art. 76, do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público.

A questão do fundo teria ocorrido durante intervalo de audiência de instrução e julgamento nos autos da Ação Penal no 2014.01.1.051915-4, na 7a Vara Criminal de Brasília do TJDFT. Nos termos do art. 76 do RICNMP promovo a seguintes diligências:

1) Seja oficiado ao Excelentíssimo Magistrado Dr. Atalá Correia, na 7a Vara Criminal de Brasília do TJDFT, solicitando cópia da mídia e termo de audiência (ocorrência: 23.01.2015 às 13h) apontado na representação;

2) Com o recebimento do material (cópia da mídia e termo de audiência), nos termos do § 1o do art. 70 do RICNMP, seja oficiado ao Senhor Presidente do Instituto Nacional de Criminalística – INC, Dr. Júlio César Kern, solicitando apoio com o escopo de realizar perícia, em 30(trinta) dias, no material recebido do Juízo da 7a Vara Criminal do TJDFT, em especial a mídia (áudio/vídeo) da audiência realizada no dia 23.01.2015 às 15h nos autos da Ação Penal no 2014.01.1.051915-4, degravando o material e apresentando as transcrições das feitas ocorridas em audiência. Solicitar, ainda, a descrição da dinâmica dos fatos ocorridos na audiência, bem como confeccionar, quadro comparativo entre as transcrições realizadas pelo INC e pelo Perito Joel Ribeiro Fernandes. Por fim, ante o conteúdo do material periciado, responder, se for possível, os seguintes quesitos constantes das conclusões do Perito Joel Ribeiro Fernandes:

a) Os locutores, pelos assuntos tratados, demonstram saber que o os “vídeos” estão editados?b) Durante a oitiva da conversa, constata-se que um dos assuntos tratados foi sobre liberar a

realização das perícias ou, não?

c) Há demonstração de que um laudo apresentado por um perito não atingiu o desejado pelos locutores e que o profissional poderia ter ajudado mais de outra forma com o seu trabalho?d) A fala do locutor L, no instante aproximado de 4min53s, indica que o mesmo está fazendo uma sugestão para que o Exmo. Juiz não respondesse sobre os equipamentos?e) Uma das locutoras (5min28s) fala, claramente, que viu os aparelhos?f) Tecnicamente, o Locutor que menciona (5min43,5s) que a perícia é na mídia e não nos aparelhos, está equivocado, pois, esta é, apenas, o suporte que armazena o conteúdo gravado? A perícia deve ser feita no conteúdo e no aparelho, para que haja apuração se características específicas observadas no sinal da gravação foram produzidas pelo gravador ou são resultados de nova regravação em sistema diferente?

Devem acompanhar os objetos a serem periciados cópias dos documentos de fls. 05/30 destes autos.

Após, com as respostas ou não dos Reclamados, certificando nos autos, bem como com a juntada do laudo pericial, concluso para análise.

Brasília/DF, 14 de janeiro de 2016

Marcelo José Guimarães e Moraes

Promotor de Justiça – MPAP

Membro Auxiliar da Corregedoria Nacional”



A defesa pede a adoção de medida enérgica e inevitável contra a arbitrariedade de que se teve notícia, para que sejam observadas e respeitadas as garantias fundamentais que a Constituição da República assegura a qualquer do povo.

Embora a conversa entre as autoridades tenha ocorrido no intervalo de uma audiência de um específico processo intentado apenas contra Berinaldo Pontes (2014.01.1.051915-4), seu teor irradia-se a todos os feitos conexos decorrentes da operação Caixa de Pandora, pois a apresentação em Juízo dos equipamentos originais utilizados por Durval Barbosa na captação de imagens e som foi pedido realizado, ao que se tem notícia, em várias das ações penais alusivas à operação supracitada.

A Defesa explica que a ação penal 707/DF, posteriormente remetida à primeira instância e transformada em mosaico acusatório, foi “num passe de mágica”, em dezenove processos, “com amparo e arrimo gravações clandestinas e sub-reptícias de Durval Barbosa, delator destinatário de benesses inexplicáveis, desfrutando de carta de indenidade absolutamente insustentável”, diz o advogado Nélio Machado.

As mídias entregues pelo delator são, em sua maioria, referentes aos anos de 2005 e 2006, e, portanto, anteriores ao mandato do ex-governador Arruda, lembra a defesa do ex-governador. E que os registros deram ensejo à captação ambiental autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça, diligência que viria a ser protagonizada pelo “colaborador” Durval Barbosa, buscando esconder, antes que tudo, as mazelas de sua conduta, traduzida em dezenas de processos criminais.

Desta feita, importante destacar o seguinte trecho da representação policial pela implementação da medida investigativa:

“4. Embora Durval já tenha apresentado vídeos feitos por ele sobre encontros e supostos pagamentos, pretende a Polícia Federal instalar equipamentos de captação ambiental de vídeo e/ou áudio no local de trabalho de Durval, a fim de registrar as situações que forem comunicadas pelo investigado colaborador.

Essa captação – apesar de se realizar com ciência e por prévia comunicação das situações pelo investigado –, não permitirá sua interferência no equipamento, mantendo, assim, a cadeia de custódia da prova porventura colhida.”



Sobre a utilização do equipamento instalado pela própria Polícia Federal, veio à tona informação de que o delator interferia no funcionamento do aparelho oficial, substituindo-o por material próprio, repassando as gravações a pessoas estranhas ao objeto das investigações:



“1.Encaminho a Vossa Senhoria o auto que trata do cumprimento, no dia 08 de outubro de 2009, do mandado de instalação de equipamento na sala de DURVAL RODRIGUES BARBOSA, expedido pelo juízo do Superior Tribunal de Justiça.

Embora tenha sido instalado o equipamento, não houve comunicação por parte do investigado no período indicado (4 a 8 de outubro) a respeito da situação que se pretendia acompanhar (suposto repasse de dinheiro de empresa Linknet), fato que dependeria de prévio reconhecimento de dívida que estaria em vias de ocorrer.Por outro lado, o investigado tem demonstrado reticência com a ação determinada pelo juízo, tem desligado o equipamento ali instalado, bem como adotando o comportamento de procurar pessoas estranhas à investigação para repassar material que teria a ele sido encaminhado.DURVAL disse irá reportar qualquer situação de relevo, desejando registrá-la com seu equipamento, conforme termo de declarações prestadas pelo colaborador a Vossa Senhoria.Sugere-se comunicação ao juízo determinante, para suspensão da medida de captação ambiental e conseqüente retirada do equipamento, pois já foi inclusive desligado por DURVAL.”



E não é só: o delator informou ocorrência de pane do equipamento da Polícia Federal, para legitimar a utilização de aparelhagem própria.

A utilização de equipamento próprio, segundo a defesa, se deu com o objetivo de editar os vídeos e manipular seu conteúdo, o que contamina a validade da prova, indubitavelmente, tudo feito de modo atípico, fora dos parâmetros da Lei e de um mínimo de controle, conspurcada a oficialidade do ato em si, causando invencível e insuperável nulidade, salvo se prevalecer o “vale-tudo”.

Essas informações servem para contextualizar a conversa travada entre os promotores atuantes no caso e o magistrado da 7a Vara Criminal, os depoimentos prestados por Durval Barbosa e seu ajudante Francinei Arruda Bezerra, os quais confessam terem editado os vídeos, manipulando-os, para somente após entregá-los ao Ministério Público, que se vale destas provas corrompidas e imprestáveis para processar o ex-governador Arruda , em uma dezena de processos, o que, segundo o advogado Nélio Machado, “se choca com o ordenamento jurídico atinente à validade da investigação, que não pode ser maculada por espertezas de “colaborador”, que atua, de ordinário, em causa própria, ungido em santidade pelos órgãos encarregados da apuração, que há de ser legal e nunca timbrada por ilicitudes sucessivas”, destaca a Defesa.



Juiz autoriza e em seguida indefere a perícia

O juiz Atalá Correia, no dia 11 de setembro de 2014, deferiu a perícia dasfitas gravadas pçor Durval, em decisão que recebeu uma das várias denúncias (processo n.o 2014.01.1.051753-4 ):

“9. Defiro o pedido formulado nos itens “j” de fls. 1428 e 1626 (perícia complementar sobre escuta ambiental em 21.10.2009- Laudo n. 1507/2011). Intime-se o Ministério Público para que indique assistente técnico e quesitos no prazo de 10 (dez) dias. Em seguida, abra-se vista a defesa, com a mesma finalidade, com prazo de 20 (vinte) dias. Após intimem-se os peritos oficiais para que, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentem laudo complementar por escrito. Questões sobre o aparelho utilizado e seu funcionamento deverão ser formuladas como quesitos”.



O item “j” mencionado na decisão do Magistrado refere-se a pedido formal das defesas de José Geraldo Maciel e Omézio Ribeiro Pontes, corréus na ação da Caixa de Pandora:

“j) Diante do laudo da Polícia Federal acostado aos autos, seja deferida perícia complementar para esclarecimentos, dentre outros dados, sobre o aparelho de escuta ambiental utilizada por Durval Barbosa na gravação ambiental realizada no dia 21/10/09 na residência oficial de Águas Claras e seu funcionamento; deferido o pleito, seja intimada a Defesa para quesitação e indicação de assistente técnico”.



O Ministério Público, dias depois, em 22 de setembro de 2014, pediu reconsideração desta decisão. Em 19 de dezembro de 2014, o juiz, em outro processo conexo, de nº 2014.01.1.051856-0, defere semelhante pedido das defesas.

Apenas em 5 de março de 2015, o juiz, seis meses depois, volta atrás em seu posicionamento, aprecia o pleito do Ministério Público e assim decide indeferir aquilo que já havia determinado, em decisão lavrada, na parte que interessa, nos seguintes termos (doc. 17):

“1. O pedido de reconsideração do Ministério Público.

1.1. O item 9 de fls. 2139 precisa ser esclarecido. A defesa afirma que a escuta ambiental de 21.10.2009 foi editada. A acusação sustenta que ela é íntegra. Não cabe, neste momento, julgar essas assertivas, pois a fase é de instrução. O contraditório pressupõe que a defesa possa manejar seus argumentos e produzir a prova a ela inerente (conf. art. 159, §5o, CPP) antes de um juízo conclusivo. Há claramente aí ponto controverso sobre o que de fato ocorreu, o que só pode ser esclarecido com a complementação requerida. Por outro lado, não foi deferida a perícia sobre equipamentos, mas a complementação do laudo já existente. O trabalho técnico dar-se-á sobre a mídia trazida aos autos. Caso os equipamentos de escuta não possam ser identificados, tal fato deverá ser indicado pela perícia.

1.2. Com razão o MPDFT, pois, sendo a prova requerida pela defesa, ela deve, inicialmente, apresentar os seus quesitos e assistentes, sendo seguida pela acusação.

(…)

Assim, reconsidero o item 14 de fls. 2139v e indefiro o pedido de perícia de fls. 1899.

(…)

Determinações.

(…)

(iii) reconsidero o item 14 de fls. 2139v e indefiro o pedido de perícia de fls. 1899.

(…)

(vii) reconsidero a decisão do item 4 de fls. 2139 e determino que o MPDFT apresente ao juízo cópia integral do procedimento relativo à delação premiada de Durval Barbosa Rodrigues, incluindo documentos relativos a sua situação patrimonial quando da oportunidade e que explicitem eventual restituição de bens ao erário.

(…)

(xiii) determino a inclusão de Francinei Arruda Bezerra como testemunha do juízo, a ser oportunamente intimada.

Intimem-se. Publique-se.

Brasília/DF, quinta-feira, 05/03/2015 às 17h54.

Atalá Correia

Juiz de Direito Substituto do DF”



Poucos dias depois, não se sabe se por coincidência, chegou ao juiz o Ofício no 20/2015, remetido pela Divisão de Contra Inteligência da Polícia Federal, informando que não seria possível localizar o equipamento de captação. Veja-se:

“Se os equipamentos de captação de áudio e de vídeo ambiental utilizados para a produção dos registros constantes do Relatório da Captação Ambiental juntado pelo MPDFT aos autos foram mantidos em custódia.

Os equipamentos em questão não foram mantidos em custódia, vez que os equipamentos dessa natureza são utilizados constantemente em diversas operações da Polícia Federal, sendo que, pelo custo do investimento e pela demanda operacional, não há condições de se custodiar todos os equipamentos utilizados a cada diligência, sob pena de inviabilizar a continuidade de outras investigações por falta de aparelhos disponíveis.

Note-se que, no caso em questão, a interceptação ambiental foi realizada em 2009, ou seja, caso custodiado para fins de perícia, os equipamentos utilizados estariam parados, por seis anos aguardando perícia ao invés de serem aproveitados em outros trabalhos, como efetivamente ocorreu.

“ Se podem ser identificados, ainda que por modelo”. Tais equipamentos são de difícil identificação, vez que todos os dados relacionados à diligência e materiais constam nos documentos produzidos à época, nos termos dos protocolos internos de utilização, não sendo localizado nos registros internos qualquer referência aos recursos materiais utilizados.

Ainda, como a Diretoria de Inteligência Policial realiza diligências em todo o território nacional e, também, presta apoio técnico às demais Unidade de Polícia Federal, sendo que, por vezes, equipamentos do órgão central são utilizados nos Estados e vice- versa, dada a necessidade do serviço.

Ante o exposto, não se mostra viável o atendimento da requisição dos dispositivos para disponibilizá-los aos peritos.”



O argumento utilizado é no mínimo equivocado, pois a Polícia Federal afirma que o citado equipamento seria utilizado em diversas operações, o que não é o caso, pois Durval Barbosa se valeu de um equipamento próprio, que deveria estar acautelado.

Não é crível que tal equipamento próprio tenha sido utilizado pela Polícia Federal em outros Estados. Se for, trata-se de apropriação indébita.

Os peritos oficiais afirmaram no Laudo nº 1944/2015-INC/DITEC/DPF que a perícia no aparelho de gravação seria fundamental para realizar o exame de verificação de fonte:



“5 – Há meios que possam comprovar tecnicamente que as duas gravações retrocitadas são cópias perfeitas das originais e autênticas, sem que conhecido o aparelho que as produziu, portanto, a sua fonte de origem? O exame de verificação de fonte visa a analisar se um registro audiovisual específico foi gerado a partir de um determinado equipamento gravador. Dentro desse contexto, a disponibilização do suposto instrumental que produziu o registro audiovisual para os peritos criminais é fundamental para analisar a sua origem. Como conclusão desse exame, os peritos criminais poderiam, em situações ideais, refutar a suposta ou alegada fonte de origem ou, no outro extremo, concluir pelo alto grau de plausibilidade de que o registro audiovisual questionado foi produzido pelo instrumental gravador apresentado, a depender do nível de concordância entre as evidências presentes no material questionado e padrão, este último produzido pelo instrumental apresentado. Como o equipamento gravador não foi disponibilizado à perícia, o exame de verificação de fonte não poder ser realizado.

Entretanto, é importante frisar, a bem da clareza, que para a realização do exame de verificação de edições a ausência do equipamento gravador não inviabiliza o exame, embora sua apresentação aos peritos criminais seja importante pois permite a aplicação de um conjunto maior de técnicas disponíveis para elucidar eventos acústicos presentes em registros audiovisuais.”



Após o diálogo nada ortodoxo com promotores, atendendo a pedido de reconsideração do Ministério Público de setembro de 2014, o juiz voltou atrás, passando a rejeitar o pedido de localização e perícia no equipamento fornecido pela Policia Federal, conforme se verá a seguir:



“L – Ontem avisaram…tá tudo editado.

LF (3min21s) – O Durval tem mais vídeos

(…)

L – Eu não acredito que eles editavam!

(…)

L (4min32,6s) – E a gente tem conver/ é debatido lá, com relação a essa questão das perícias, a gente fica sempre naquela dúvida, de deixar, concordar, pra não alegarem depois nulidade… mas a gente não sabe até onde vai levar isso …

(…)

L1 (JUIZ) – É. Pois éée. Eu tou assim…

(…)

L (4min54s) – Não responda sobre o equipamento. <<fala subposta>>

L1 (JUIZ) (4min55,5s) – Não, não, eu só precisaria dessa, dessa conversa [assim]…

(…)

LF (5min23s) – Se aparecer vai ser uma loucura né? mas os aparelhos já tão aí.

L1 (JUIZ) – Mas eu acho assim, se o aparelho não existe mais…

L (5min27s) – O senhor pode dizer que não tem. <<fala subposta>>

L1 (JUIZ) – Isso aí é uma questão de…

LF (5min28s) – Tem, eu vi o aparelho.”



Logo no início do inusitado diálogo, no instante 3min17s alguém refere, sobre as mídias produzidas no curso da delação premiada, que “ontem avisaram, tá tudo editado”, ao que se segue uma voz feminina assinalando que “o Durval tem mais vídeos”.

Neste ponto, a autoridade coatora afirma, sempre segundo o parecer técnico:



“Mas o vídeo tá muito cortado”.



Esse diálogo entre autoridades evidencia o que as defesas insistiram tantas vezes em destacar: a manipulação fraudulenta das mídias que embasam as acusações, admitida, aliás, pelo próprio Durval e seu auxiliar Francinei, na ação de improbidade administrativa.

Fica claro, também, que Durval guardaria, ele próprio, mais vídeos, de conteúdo desconhecido das defesas.

Voltando à degravação, observa-se que nela, aos 4min32,6s, afirma-se:



“…com relação a esta questão das perícias a gente fica sempre naquela dúvida, de deixar, concordar, para não alegarem depois nulidade… mas a gente não sabe até onde vai levar isso”.



A gravação deixa entender que tanto juiz quanto promotores não desconheciam a edição dos vídeos e manifestaram dúvida sobre como proceder quanto aos pedidos da defesa – se exarando promoções favoráveis às perícias complementares, para evitar nulidade, ou, pelo contrário, posicionando-se contra a diligência.

Note-se que os diálogos, em conversação atípica, se realizaram na presença do juiz a quem cabe garantir a custódia de todos os objetos que interessam de alguma forma ao processo.

O juiz deu a sua impressão sobre o contexto do tema versado com os acusadores, sem a presença da defesa:



“É, pois é. Eu tô assim…”.



“Não responda sobre equipamento”

O Ministério Público – conhecedor dos diversos pleitos no sentido de que fosse realizada perícia no equipamento fornecido ao delator pela Polícia Federal – pede ao Juiz:



– “Não responda sobre equipamento”,



Ao que este assegura:



– “Não, não, eu só precisaria dessa conversa….”;



Ao que uma voz feminina ao fundo (5min23s) arremata:



– “Se aparecer vai ser uma loucura, né?”



Segue-se a conversa com uma suposta deliberação sobre o que fazer com o aparelho fornecido pela Polícia Federal ao delator – objeto que interessa ao processo e que jamais poderia ser sonegado a qualquer das partes.

No meio das falas, sobre as consequências da não realização da perícia, veja o seguinte trecho:



– “O senhor pode dizer que não”.



Escuta-se, sempre com perplexidade, uma voz feminina ao fundo dizer:



“Tem, porque eu vi o aparelho”.



E um dos interlocutores arremata:



– “A defesa é fogo, mas se um dia aparece…se existir os aparelhos…”



Estranha e coincidentemente, depois desse diálogo, em 13 de março de 2015, o Ofício no 20/2015, produzido pela Divisão de Contra Inteligência da Polícia Federal, informando que não seria possível localizar o equipamento de captação utilizado pelo delator.

Há de se reconhecer a congruência cronológica entre esse diálogo e o que se passou nos processos: o juiz havia sinalizado, inicialmente (em setembro de 2014), que o equipamento da Polícia Federal e as mídias poderiam ser submetidos a perícias complementares, chegando a instar as Defesas a informar o que pretendiam periciar.

O ofício da Polícia Federal informando sobre a impossibilidade de periciar o aparelho utilizado por Durval Barbosa só veio a ser comunicado em 13 de março de 2015, poucos dias depois da reconsideração do juiz.

Como se vê, o desate da questão pericial ocorreu exatamente na linha do diálogo havido entre as autoridades.

Outro trecho do diálogo inusitado revela algo não menos grave. Em dado instante, há uma espantosa revelação, feita, ao que parece, pelo membro do MP:



– “[Só fazer uma Memória] Pro Senhor, só o que aconteceu, o que vinha acontecendo. O Durval tem processos em quase todas as varas criminais, né? O que que a gente fazia? A gente levava o processo debaixo do braço, e os juízes, pasmem: O que que o senhor quer? O senhor quer



tempo?”



Logo em seguida, um dos representantes do Ministério Público afirma – é o que se colhe da perícia – que tem em seu poder duas caixas de depoimentos do delator que não foram juntadas aos autos, o que conduz à constatação de que elementos probatórios fundamentais ao deslinde da causa deixaram, deliberadamente, de ser apresentados.

Noutro passo, o juiz recebe a informação de que vídeos contendo tarja preta estão seguramente editados, e ouve, passivamente, um membro do MP afirmar:



– “Por isso eu queria apresentar o do Marcelo Toledo [um dos acusados da operação “Caixa de Pandora”]….mas não devo”.



Os diálogos evidenciam, no mínimo, que:

a) MPDFT e juiz tinham conhecimento de que as provas haviam sido deliberadamente manipuladas pelo delator;b) MPDFT e o juiz , por seus representantes, trocam ideias para impedir que venha aos autos objeto – equipamentos de gravação de áudio e vídeo – umbilicalmente vinculado a todos os processos oriundos da cognominada operação.



É relevante registrar o que consta do termo de audiência do dia 23/01/2015:



TERMO DE AUDIÊNCIA



“No dia 23/1/2015, às 13h, nesta cidade de Brasília, Distrito Federal, e na sala de Audiências deste Juízo, fizeram-se presentes o Juiz de Direito Substituto, Dr. ATALÁ CORREIA; os Promotores de Justiça, Drs. CARLOS AUGUSTO SILVA NINA e SÉRGIO BRUNO CABRAL FERNANDES; a advogada, Dra. LEILA BARRETO ORNELAS, OAB/DF 13900 E ANDRÉ LUÍS NUNES GOMES, OAB/DF 7998 pelo acusado; comigo, Alex Kazuo Aoyama Regino, Técnico Judiciário.

Feito o pregão, presente a testemunha do MP: DURVAL BARBOSA RODRIGUES. Presente o acusado BERINALDO DA PONTE. Iniciada a audiência, ouviu-se o presente. Em seguida passou-se ao interrogatório do acusado.

O Ministério Público e a defesa do acusado não manifestaram oposição à adoção do sistema de perguntas e reperguntas pelo Ministério Público, desde que a defesa se manifeste por último.

Às 15h, com o consentimento das partes, foi realizada segunda gravação em equipamento autônomo, para garantir a redundância de recursos e a integralidade do áudio, considerando que a gravação pelo sistema de gravação digital integrado ao computador desta Vara apresentou instabilidades, com perda de parte do conteúdo.

A instrução foi registrada por meio do sistema audiovisual, nos termos do art. 405, §1o, do CPP.

O MP e a Defesa requereram, na fase do artigo 402 do CPP, vista dos autos.

Pelo MM. Juiz de Direito Substituto, foi proferido o seguinte despacho: “Dê-se vista, pelo prazo de 5 dias, ao MP e após à defesa. Após, façam-se os autos conclusos.”. Nada mais encerrou-

se o presente às 17:26.”



Ainda que o equipamento tivesse apresentado “instabilidade”, como consignado no termo de audiência, essa falha técnica, à toda evidência, não seria apta a captar diálogo inexistente entre autoridade coatora e membros do Ministério Público, segundo o laudo do perito Joel Ribeiro Fernandes. As informações são do “Blog do Callado”.