Por Gleisson Coutinho
A instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os descontos indevidos em benefícios do INSS tinha tudo para ser um momento histórico de reparação. Afinal, estamos falando de um escândalo que atingiu diretamente aposentados e pensionistas, justamente os mais vulneráveis do sistema de seguridade social. Mas, antes mesmo de começar a engrenar, a investigação já sofre o peso do jogo político, revelando que a busca pela verdade não é prioridade de todos os lados.
O ponto mais polêmico: a resistência da base governista em convocar Frei Chico, irmão do presidente Lula e vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi). Citado em relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre possíveis fraudes, Frei Chico deveria ser um dos primeiros nomes a prestar esclarecimentos. Mas não é. A base petista atua para blindá-lo, evitando que seu nome seja colocado em votação em bloco ao lado de outros alvos. A manobra permite que a eventual convocação dele dependa de votação individual, abrindo espaço para articulações de bastidores que garantam sua proteção.
O
discurso usado para justificar essa blindagem é frágil. O presidente da CPMI,
senador Carlos Viana (Podemos-MG), afirmou que não haverá convocações “sem
provas” e que não se deve politizar o processo. Mas a pergunta é inevitável: se
não há nada a esconder, por que tanto esforço em barrar o depoimento de quem
ocupa posição de destaque em uma entidade diretamente mencionada no escândalo?
A ausência de convocação não fortalece a investigação pelo contrário, mina a
credibilidade da comissão.
O que se
desenha é uma cortina de fumaça. A esquerda, que historicamente se coloca como
defensora dos trabalhadores, agora parece mais preocupada em blindar seus próprios
quadros do que em proteger os aposentados lesados. É uma postura contraditória
e, sobretudo, desrespeitosa com milhões de idosos que tiveram descontos
indevidos em seus benefícios.
O plano
de trabalho aprovado prevê ouvir ex-presidentes do INSS, ex-ministros da
Previdência e dirigentes de entidades conveniadas. É um recorte importante, mas
soa incompleto quando se omite justamente quem deveria ser exemplo de
transparência. Frei Chico, ao não ser convocado, torna-se símbolo de uma
investigação que começa com o pé manco.
Não é
exagero afirmar que estamos diante de um dos maiores escândalos contra
aposentados no Brasil. O mínimo que se espera é uma apuração sem amarras
políticas. Porém, o que se vê é uma CPMI dividida entre a oposição, que tenta
avançar, e a base governista, que se agarra à velha lógica de que aliados devem
ser preservados a qualquer custo.
Enquanto
isso, a vítima é a verdade e junto com ela, os aposentados que já foram
explorados e agora assistem à política lhes negar justiça. Se a CPMI não tiver
coragem de enfrentar todos os nomes, doa a quem doer, corre o risco de se
transformar em mais um teatro de Brasília: barulho na superfície, acordos nos
bastidores, e impunidade garantida.
A
história já nos ensinou que escândalos abafados voltam mais fortes. Se o
governo e sua base acreditam que blindar figuras ligadas ao poder resolverá o
problema, estão apenas alimentando uma cobra que cedo ou tarde morderá de
volta.
Fonte: A Redação