segunda-feira, 4 de abril de 2011

Bandarra rebate acusações

Do Correio BrazilienseCriado em dezembro de 2004 para exercer o papel de fiscalização da atuação de promotores e procuradores de todo país, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) vai julgar nesta quarta-feira (6) o caso mais rumoroso envolvendo dois integrantes da carreira. Acusado de vários crimes, Leonardo Bandarra é um alvo de alto escalão envolvido em denúncias tão graves. Nomeado duas vezes pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o Ministério Público do DF, ele foi durante dois anos, entre 2007 e 2009, o presidente da entidade que representa todos os procuradores-gerais de Justiça do Brasil. Até o escândalo deflagrado por Durval Barbosa, o delator da Operação Caixa de Pandora, ele era cotado para ocupar um dos assentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) na próxima aposentadoria de um representante do MP naquela corte.
Na última sexta-feira, os advogados de Bandarra requereram e o relator do processo no CNMP deferiu a quebra do sigilo das informações da defesa. Com o consentimento do conselheiro Luiz Moreira, os advogados Cézar Bitencourt e Gabriela Bemfica convidaram jornalistas ontem para apresentar a versão de Bandarra. Eles sustentam que não há provas de participação do ex-procurador-geral nos crimes relatados pela comissão processante do CNMP. Segundo Bitencourt, não há imagens de Bandarra recebendo dinheiro ou em qualquer situação que comprove as acusações.
Os advogados sustentam ainda que Bandarra é “um troféu para os investigadores”. O mais grave, segundo a defesa, é que ele enfrenta denúncias feitas por um criminoso a quem levou para o banco dos réus. “É inacreditável a credibilidade que se confere a um cidadão, delator, que tanto foi processado pelo próprio Ministério Público por crimes de corrupção. É inacreditável que a palavra desse corrupto possa, isoladamente, derrubar o próprio chefe da instituição que tanto o combateu”, diz Cézar Bitencourt nas alegações finais.
Nesta semana, Bandarra e a promotora de Justiça Deborah Guerner precisam convencer os 14 integrantes do CNMP de que são honestos. Relatório da comissão processante, criada para investigar a conduta dos dois colegas, aponta a participação deles em crimes e atos de improbidade administrativa. O relator apresentará um voto que será apreciado pelos demais conselheiros. Bandarra e Deborah são acusados de receber de Durval R$ 1,6 milhão em troca de informações sigilosas da Operação Megabyte. Também terão de responder por suposta tentativa de extorsão ao ex-governador José Roberto Arruda. A conclusão da comissão é de que eles exigiram R$ 2 milhões do ex-chefe do Executivo do DF, em junho de 2009, para que não divulgassem vídeo em que Arruda aparece recebendo dinheiro de Durval.
Suspeita
Pesa ainda a suspeita de que Durval retirou da internet por meio de hacker, a pedido de Deborah e Bandarra, uma nota intitulada “MP Contaminado”, com declarações ofensivas aos dois promotores, ligando-os a um suposto favorecimento de empresas do ramo de coleta de lixo. Bandarra ainda é acusado de interferir no trabalho do promotor Mauro Faria de Lima, com pedido, em 2009, para que não denunciasse o então comandante-geral da PM, Antônio Cerqueira, por desvios de recursos.
Todas essas denúncias tramitam na esfera judicial, por inciativa do procurador regional da República Ronaldo Albo. Cabe agora a análise sobre a permanência ou não de Bandarra e Deborah nos quadros do Ministério Público. Bandarra promete sentar-se na primeira fila do auditório do CNMP para assistir ao julgamento mais importante de sua vida.
Linha da defesa
» Encontros impróprios entre Leonardo Bandarra e autoridades do GDF

Conclusão sobre a relação entre o Ministério Público do DF e o Poder Executivo, considerada imprópria e sem a necessária formalidade, não está respaldada em nenhuma regulamentação ou lei que se refira ao local onde o procurador-geral de Justiça do DF deve se reunir com o governador. Segundo a defesa, nunca houve pedido de Bandarra para que Durval fosse mantido no governo e as reuniões sempre foram pautadas por assuntos de interesse institucional. Presente num dos encontros entre o então governador José Roberto Arruda na casa de Bandarra, a promotora Alessandra Queiroga sustentou, em depoimento, que, na verdade, questionou a permanência de Durval no cargo, mesmo após tantas denúncias de corrupção.
» Interferência no trabalho do promotor de Justiça Mauro Faria de Lima sobre denúncia contra comando da PM
A comissão processante teria considerado apenas o depoimento de Mauro Faria de Lima sobre uma suposta ingerência constrangedora de Bandarra na elaboração da denúncia preparada pelo primeiro contra o então comandante-geral da Polícia Militar do DF, Antônio Cerqueira. Na análise dos fatos, os investigadores teriam desconsiderado depoimentos dos promotores Nísio Tostes e Paulo Gomes, que atuam em processos militares. Eles disseram que não houve interferência a pedido de Arruda, apenas um pedido para que Mauro aguardasse alguns dias antes de ajuizar a ação, enquanto se discutia a sucessão no comando da PM. Eles queria esperar as comemorações dos 200 anos da PM e a oficialização de um pedido de aposentadoria de Cerqueira.
» Retirada da internet de nota ofensiva a Bandarra por Durval Barbosa, a pedido dele e de Deborah Guerner
A defesa alega que não havia necessidade de Leonardo Bandarra pedir à colega Deborah Guerner para que esta retirasse da web nota intitulada “Ministério Público Contaminado” que ligou os dois promotores a contratos suspeitos de coleta de lixo. Segundo os advogados, a nota foi reproduzida na intranet do MPDFT por opositores internos e já havia produzido estragos à imagem de Bandarra. Ele também já pedira à Procuradoria-geral da República e à Polícia Federal providências oficiais contra os autores da nota.
» Violação do sigilo funcional, ao vazar informações sobre a Operação Megabyte
Os advogados de Bandarra sustentam que não houve vazamento por parte do cliente de informações privilegiadas da operação, que foi realizada com o objetivo de levantar informações sobre lavagem de dinheiro de contratos de informática. Eles citam trecho do depoimento do promotor responsável pelas investigações, segundo o qual a operação obteve êxito na busca e apreensão pois em um dos alvos foram obtidos documentos que comprovam movimentação financeira e imobiliária que se buscava na apuração. Também sustentam que Durval soube da Operação Megabyte um mês antes da elaboração da petição inicial do MP que afirmou ter visto, tanto que teria iniciado a transferência de suas empresas para laranjas, como forma de se proteger.
» Tentativa de extorsão a Arruda no valor de R$ 2 milhões para não divulgar vídeo
Sustentam os advogados que o ex-governador Arruda disse, em depoimentos, que teria partido exclusivamente da promotora Deborah Guerner o suposto achaque. Citam depoimento de Arruda segundo o qual as relações com Bandarra sempre foram “absolutamente corretas”.
» Imagens captadas na casa da promotora Deborah Guerner
Segundo a defesa, os vídeos feitos pelo circuito interno na casa da promotora  não comprovariam qualquer ilícito ou apontariam que Bandarra recebeu dinheiro da colega ou do marido dela, Jorge Guerner

Álvaro Dias diz que Jucá deve explicações sobre denúncias do mensalão

O líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR), cobrou do líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), esclarecimentos sobre um suposto recebimento de recursos de uma das empresas de Marcos Valério. Ele foi apontado, em 2006, pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios como o operador financeiro do repasse de recursos para a compra de votos de parlamentares favoráveis ao governo, conhecido como mensalão.

O nome de Jucá não constou do relatório final da CPMI mas, agora, a revista Época divulgou trechos do relatório final das investigações feitas pela Polícia Federal, em que aparece o nome de uma empresa de propriedade do irmão do senador, Álvaro Jucá, que teria recebido R$ 650 mil da DNA, uma das agências de publicidade de Marcos Valério.

"Até por respeito à Casa, seria bom que o senador Romero Jucá prestasse esclarecimentos aos seus colegas sobre o que ocorreu", disse o líder tucano. Álvaro Dias acrescentou que o importante, neste momento, é que o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal (STF) deem celeridade ao julgamento. "Não se pode deixar que um crime como esse, apurado em 2006, que denunciou 40 pessoas, deixe-os impunes por causa de prescrição", disse o senador.

A assessoria do líder Romero Jucá informou que ele não deve ir hoje ao Senado, pois ainda está em viagem.

Sarney pede investigação de denúncias sobre ponto eletrônico no Senado

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), já enviou ofício para a Diretoria-Geral do Senado para que se abra sindicância a fim de investigar a conduta de funcionários flagrados pela imprensa, na sexta-feira (1º) registrando a frequência no ponto eletrônico e retornando para casa. O documento, segundo o parlamentar, foi encaminhado na noite da própria sexta-feira, ao tomar conhecimento do assunto.

No ofício, Sarney deixa clara a determinação a diretores e chefes de serviços “para que redobrem a vigilância” sobre seus subordinados. Ao mesmo tempo, o parlamentar frisou que esses superiores hierárquicos serão corresponsabilizados no caso de confirmadas as denúncias de que funcionários fraudam o ponto eletrônico e não trabalham nos horários que deveriam.

Para qualquer medida mais extrema, como o desligamento dos servidores, é necessário que se confirmem as denúncias. “Exoneração só pode haver depois do inquérito administrativo. O Estatuto do Funcionalismo Público determina assim, antes não. A primeira providência é a sindicância para saber se o fato existiu”.

Sobre a confirmação, pela Polícia Federal, das denúncias feitas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios, em 2005 e 2006, do esquema de compra de votos de parlamentares, conhecido como mensalão; o presidente do Senado evitou qualquer comentário. Ele acrescentou que nem chegou a ler a reportagem da revista Época, que traz detalhes do esquema e o suposto envolvimento de novos nomes.

“Eu estava no Amapá. Fui ao sepultamento do meu suplente que morreu repentinamente. Cheguei ontem à noite e ainda não tive condições de ver a reportagem da Época. Por isso, não posso opinar ainda sobre o assunto.”

Homem é preso após estuprar namorada do filho em Samambaia

Um homem de 41 anos foi preso, na madrugada desta segunda-feira (4/4), após estuprar a namorada do filho dentro de casa na QR 512 em Samambaia Sul. Ezequias Carneiro da Silva foi localizado horas depois perto da residência por policiais militares. Segundo a 32ª Delegacia de Polícia (Samambaia), o próprio filho de Ezequias denunciou o pai à polícia.

O estupro aconteceu na noite de domingo (3/4), quando a nora de 18 anos estava na casa de Ezequias. O namorado teria saído e demorado cerca de uma hora para voltar. De acordo com a polícia, durante esse tempo, Ezequias ameaçou a jovem com uma faca e a obrigou a manter relações sexuais com ele. Quando o filho chegou em casa, a namorada relatou o que havia acontecido.

Os dois foram até à 32ª DP e registraram a ocorrência. Depois de ter sido preso, Ezequias da Silva ainda negou o crime. No entanto, o exame de corpo delito comprovou o estupro. A polícia informou que o Ezequias já tinha sido condenado a 12 anos de prisão por um estupro realizado em 2004 na mesma região. Ele cumpriu metade da pena e estava em regime domiciliar. Ezequias vai responder novamente pelo crime de estupro e pode pegar de seis a dez anos de prisão

Da revista ÉPOCA (A anatomia do valerioduto) (MENSALÃO DO PT)

ÉPOCA obteve o relatório final da Polícia Federal sobre o caso do mensalão. Ele revela que o dinheiro usado por Marcos Valério veio dos cofres públicos e traz novas provas e acusações contra dezenas de políticos
O OPERADOR
Marcos Valério, o artífice do mensalão, em 2007. Mais de cinco anos depois, a polícia concluiu a investigação sobre o maior escândalo de corrupção do governo Lula.
Era uma vez, numa terra não tão distante, um governo que resolveu botar o Congresso no bolso. Para levar a cabo a operação, recorreu à varinha de condão de um lobista muito especial, que detinha os contatos, os meios e o capital inicial para fazer o serviço. Em contrapartida, o lobista ganharia contratos nesse mesmo governo, de modo a cobrir as despesas necessárias à compra. Ganharia também acesso irrestrito aos poderosos gabinetes de seu cliente, de maneira a abrir novas perspectivas de negócios. Fechou-se o acordo – e assim se fez: o lobista distribuiu ao menos R$ 55 milhões a dezenas de parlamentares da base aliada do governo. O governo reinou feliz para sempre.
Mas somente por dois anos. Há seis anos, em junho de 2005, pela voz do vilão e ex-deputado Roberto Jefferson, a fantástica história do maior escândalo de corrupção já descoberto no país, conhecido como mensalão, veio a público. O governo quase ruiu. Seu líder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, disse que “devia desculpas” ao país. Os dirigentes do PT, o partido responsável pelo negócio com o lobista, caíram um após o outro, abalroados pelas evidências de que, não, aquela não era uma história de ficção: era tudo verdade.
Sobrevieram as investigações de uma CPI (a última que chegou a funcionar efetivamente no país) e a enfática denúncia do procurador-geral da República, que qualificou o grupo como uma “organização criminosa”, liderada pelo primeiro-ministro informal desse governo, o petista José Dirceu. A realidade dos fatos abateu-se sobre as lideranças do partido. Tarso Genro, um deles, falou em refundar o partido. Lula pediu desculpas mais uma vez. O então deputado José Eduardo Cardozo reconheceu que houve mensalão, e que era preciso admitir os fatos.
Parecia que haveria um saudável processo de depuração ética em Brasília. Parecia. Os anos passaram, e a memória dos fatos esvaiu-se lentamente, carregada pelo esforço dos mesmos líderes petistas de reconfigurar o que acontecera através das lentes da má ficção. Dirceu começou a declarar que não houve compra de votos. Petistas disseram que o esquema não fazia sentido, uma vez que, como eram governistas, não precisariam receber dinheiro para votar com o governo – esquecendo que o valerioduto também contemplava o pagamento de campanhas políticas com dinheiro sujo. Delúbio Soares, o tesoureiro que coordenou os pagamentos, disse que tudo se tornaria piada de salão. Agora, obteve apoio para voltar ao partido, de onde fora expulso quando era conveniente a seus colegas. Por fim, quando estava prestes a terminar seu mandato, Lula avisou aos petistas: “O mensalão foi uma farsa. Vamos provar isso”.

São as voltas que o planeta político dá. Em Brasília, como se percebe, ele gira com especial rapidez. José Eduardo Cardozo agora é ministro da Justiça. Foi sob o comando dele que a Polícia Federal produziu sigilosamente um documento devastador, cujas 332 páginas resultam demolidoras para muitos dos próceres da República. Trata-se do relatório final da Polícia Federal sobre o caso do mensalão, que encerra oficialmente os seis anos de extensas investigações conduzidas por delegados, agentes e peritos especializados no combate ao crime organizado. A peça já está sobre a mesa do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e deverá seguir em breve para o gabinete do ministro Joaquim Barbosa, o relator do caso do mensalão no Supremo Tribunal Federal.
Liderada pelo policial Luís Flávio Zampronha, delegado que coordena o caso desde o início e integra a divisão de Repressão a Crimes Financeiros, a PF vasculhou centenas de contas bancárias, esmiuçou dezenas de documentos internos das empresas envolvidas no esquema e ouviu cerca de 100 testemunhas. Produziu-se esse minucioso trabalho por determinação do ministro Joaquim Barbosa. O objetivo era produzir provas acerca dos pontos que não haviam sido contemplados nas investigações da CPI dos Correios e da Procuradoria-Geral da República. As dúvidas dividiam-se em três perguntas elementares:
1. O mensalão foi financiado com dinheiro público?
2. Houve mais beneficiários do valerioduto?
3. Qual era o limite da influência de Marcos Valério no governo petista?
A investigação da PF dissolve essas incertezas – e faz isso com muitas, muitas provas. A resposta às duas primeiras perguntas é sim, sem dúvida. A resposta à terceira? Nenhum. Não há mais argumentos falaciosos, teses descabidas ou teorias conspiratórias que permitam ignorar os fatos colhidos pela PF. Derrubam-se, assim, os mitos que setores do PT, sobretudo sob a liderança moral e simbólica do presidente Lula, tentaram impor à opinião pública. O mensalão não foi uma farsa. Não foi uma ficção. Não foi “algo feito sistematicamente no Brasil”, como chegou a dizer o ex-presidente. O mensalão, como já demonstravam as investigações da CPI dos Correios e do Ministério Público e agora se confirma cabalmente com o relatório da PF, consiste no mais amplo (cinco partidos, dezenas de parlamentares), mais complexo (centenas de contas bancárias, uso de doleiros, laranjas) e mais grave (compra maciça de apoio político no Congresso) esquema de corrupção já descoberto no país. O significado político e, sobretudo, simbólico do fim desse debate é enorme – e pode alterar os rumos do processo do mensalão no STF, que até o momento tendia para uma vagarosa morte jurídica.
Ao responder ao que lhe foi pedido, a PF avança ainda mais. Eis as principais descobertas expostas no relatório:
§                                 Chegou-se, finalmente, ao elo mais grave do esquema do valerioduto: a conexão com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O segurança Freud Godoy, que trabalha com o petista desde a campanha de 1989 e desfruta a intimidade da família de Lula, confessou à PF que recebeu R$ 98 mil de Marcos Valério. Disse que se tratava de pagamento dos serviços de segurança prestados a Lula na campanha de 2002 e durante a transição para a Presidência;
§                                 Os peritos da PF rastrearam o envolvimento de mais grão-políticos no esquema. Direta ou indiretamente, seja por meio de assessores ou de familiares, em campanhas políticas ou no exercício do mandato, receberam dinheiro do valerioduto políticos poderosos, como o minis-tro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, do PT, e o eterno líder do governo no Congresso, senador Romero Jucá, do PMDB. Descobriu-se também, ou se conseguiu confirmar, a participação de mais sete deputados federais, dois ex-senadores e um ex-ministro (leia a nova lista do esquema abaixo);

§                                 O banqueiro Daniel Dantas, que participava de uma das mais renhidas e bilionárias disputas societárias do Brasil – e que, para resolver seus problemas, precisava desesperadamente de aliados no Palácio do Planalto –, tentou mesmo garantir o apoio do governo petista por intermédio de dinheiro enviado às empresas de Marcos Valério. Depois de se reunir com Dirceu, então ministro da Casa Civil, Dantas recebeu de Delúbio um pedido especial de ajuda financeira: US$ 50 milhões. Segundo a PF, a propina foi aceita. Pouco antes de o mensalão vir a público, uma das empresas controladas pelo banqueiro fechou contratos fajutos com Valério – apenas para que houvesse um modo legal de depositar o dinheiro. Houve tempo suficiente para que R$ 3,6 milhões fossem repassados ao publicitário. Encaminhou-se esse total a doleiros, mas a PF ainda não descobriu os reais beneficiários do dinheiro;
§                                 São comprovadamente fajutos os empréstimos que, segundo a defesa de Marcos Valério, explicariam a origem do dinheiro do mensalão. Esses papéis serviram somente para dar cobertura jurídica a uma intrincada operação de lavagem de dinheiro. Apurou-se que houve duas fontes de recursos para bancar o mensalão e as demais atividades criminosas de Marcos Valério. Uma, a principal, qualificada pela PF de “fonte primária”, consistia em dinheiro público, proveniente dos contratos do publicitário com ministérios e estatais. O principal canal de desvio estava no Banco do Brasil, num fundo de publicidade chamado Visanet, destinado a ações de marketing do cartão da bandeira Visa. As agências de Marcos Valério produziam algumas ações publicitárias, mas a vasta maioria dos valores repassados pelo governo servira tão somente para abastecer o mensalão. A segunda fonte de financiamento, chamada de “secundária”, estipulava que Marcos Valério seria ressarcido pelos pagamentos aos políticos por meio de contratos de lobby com empresas dispostas a se aproximar da Presidência da República. Foi o caso do Banco Rural, que tentava obter favores do Banco Central e do banqueiro Daniel Dantas, que precisava do apoio dos fundos de pensão das estatais.
Das dezenas de novos beneficiários identificados, o mais representativo é Freud Godoy. O segurança pessoal de Lula ficou conhecido na campanha de 2006, quando recebeu de Lula a alcunha de Aloprado, em razão de seu envolvimento com a turma que foi presa num hotel de São Paulo, tentando comprar um dossiê contra o tucano José Serra. (Às vésperas daquelas eleições, a PF divulgou uma foto exibindo seis vistosos pacotes de dinheiro em cima de uma mesa. Nunca se descobriu a origem do dinheiro.) Freud não é apenas segurança de Lula. É amigo do ex-presidente, relação que nasceu nos anos 80 e sobrevive até hoje. Até o episódio dos aloprados, onde quer que Lula estivesse, lá estava Freud. Não era uma sombra barata. Em 1998, Freud profissionalizou seus serviços e criou uma empresa. No escândalo dos aloprados, descobriu-se que essa empresa, a Caso Comércio, recebeu R$ 98 mil da SMP&B, uma das agências de Marcos Valério. O pagamento dera-se em 21 de janeiro de 2003. Diante dos milhares de operações bancárias nas contas do publicitário, poderia haver uma explicação plausível e legal para a transação. Algum serviço poderia ter sido prestado normalmente. Quando essa informação veio a público, porém, Freud e Marcos Valério silenciaram sobre o motivo do pagamento. Restou a suspeita de que haveria alguma ilegalidade.
Os delegados da PF foram atrás de Freud – e ele narrou, em depoimento, que o dinheiro serviu para cobrir parte dos R$ 115 mil que lhe eram devidos pelo PT, em razão dos serviços prestados durante a campanha presidencial de 2002. Segundo Freud, tratava-se de despesas de “segurança, alimentação, transporte e hospedagem de equipes de apoio”. O segurança contou que, após a campanha, foi ao comitê eleitoral do PT cobrar a dívida. Os responsáveis pelo comitê, cujos nomes Freud não revela, deram-lhe o número de telefone de uma empresa que resolveria a pendência. Ele ligou e descobriu que se tratava da SMP&B. “Jamais mantive contato com Marcos Valério”, disse Freud à PF. Os funcionários de Marcos Valério pediram que ele lhes fornecesse uma nota fiscal. Ato contínuo, Freud recebeu o cheque de R$ 98 mil pelos Correios. O segurança afirmou que não havia contrato entre sua empresa e o PT, nem qualquer registro contábil das despesas. Em suma: um amigo de Lula, que sempre prestou serviços a ele, recebeu dinheiro ilegal para pagar suas despesas trabalhando para o ex-presidente. É a primeira vez em que se descobre uma ligação direta entre o esquema de Marcos Valério e alguém da intimidade de Lula.
LADO A LADO
O ex-presidente Lula caminha na Granja do Torto na companhia de seu segurança Freud Godoy, em dezembro de 2002, na transição de governo. Freud era, na ocasião, remunerado por Marcos Valério
Marcos Valério detinha uma capacidade espantosa de unir amigos e dinheiro. Sabia como conquistar os poderosos – ou conquistar amigos dos poderosos. Deu dinheiro ao amigo de Lula, o ex-presidente, e também a um grande amigo da atual presidente, Dilma Rousseff. Fernando Pimentel conhece Dilma desde os tempos de luta armada contra o regime militar. Mineiros, ambos militaram juntos, dividindo aparelhos e ideais. A presidente confia a tal ponto em Pimentel que delegou a ele parte da coordenação política de sua campanha presidencial. Não se arrependeu. Hoje, como ministro do Desenvolvimento e confidente de Dilma, Pimentel ocupa espaço no primeiro time da Esplanada. Quando eclodiu o mensalão, surgiram suspeitas de que Rodrigo Barroso Fernandes, tesoureiro de sua campanha vitoriosa à prefeitura de Belo Horizonte, em 2004, recebera dinheiro do valerioduto. Naquele momento, quando as denúncias se sucediam em turbilhão, a suspeita diluiu-se em meio a tantas outras.

 A metamorfose ambulante
Ao longo de seu governo, o ex-presidente Lula mudou sua retórica sobre o escândalo. Passou da indignação à negação
"Não interessa se foi A, B ou C, todo o episódio foi como uma facada nas minhas costas" - Lula, em dezembro de 2005, sobre o episódio do escândalo do mensalão
"Mensalão é uma farsa" - Lula, em conversa com José Dirceu durante o café da manhã no Palácio da Alvorada em 18 de novembro de 2010. Na ocasião, o ex-presidente avisou que quando deixasse o governo iria trabalhar para desmontar o mensalão

A PF, contudo, perseguiu a pista. Rastreando as contas do valerioduto, os investigadores comprovaram que o assessor de Pimentel recebeu um cheque de R$ 247 mil de uma das contas da SMP&B no Banco Rural. Quando? Em 12 de agosto de 2004, período em que a campanha de Pimentel começava a engrenar. Ouvido pelos delegados, Rodrigo Barroso se recusou a dar explicações. Preferiu o silêncio. Diante disso, a PF recomendou ao procurador-geral da República que processe o assessor, ao menos, por lavagem de dinheiro. Segundo a PF, as evidências sugerem fortemente que a campanha do ministro Pimentel tenha sido financiada com dinheiro do valerioduto. Pimentel afirmou que não comentaria o caso sem antes ler o relatório.
Dinheiro para pagar campanha era artigo abundante no valerioduto. Nas eleições de 2004, além de Pimentel, Marcos Valério, naturalmente por ordens do comando do PT, repassou recursos a duas outras candidaturas do partido em São Paulo: a de Emídio de Souza à prefeitura de Osasco (R$ 189 mil) e a do hoje deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, à prefeitura de São Bernardo do Campo (R$ 17 mil). Entre os novos beneficiários do PT, a PF descobriu uma militante que trabalhou para Ivan Guimarães, então presidente do Banco Popular, que pertence ao Banco do Brasil. A funcionária, Renata Maciel, sacou R$ 150 mil na agência do Rural, em plena Avenida Paulista. A operação aconteceu em novembro de 2004, logo após o período eleitoral. Em seguida, ela passou a trabalhar numa joalheria que pertencia a Ivan Guimarães. Há muito mais operações de caixa dois em eleições, como no PT de Alagoas. Mais incomuns são casos como os do ex-ministro Pimenta da Veiga e do deputado José Mentor, que receberam uma dinheirama do valerioduto, disseram que prestaram serviços a ele como advogados – mas não convenceram a PF (leia os quadros anteriores).
O segredo para os investigadores desvendarem as engrenagens de lavagem de dinheiro armadas pela quadrilha de Marcos Valério está nas contas do publicitário que recebiam recursos do fundo Visanet, em tese destinado ao marketing de cartões da bandeira Visa. Somente no governo Lula, o fundo repassou R$ 68 milhões às agências de Marcos Valério. Ao analisar os milhares de transações bancárias do esquema, os peritos perceberam que a saída de dinheiro para os políticos coincidia com a entrada de recursos desse fundo, liberados pelo Banco do Brasil. A partir dessa descoberta, foi possível rastrear o caminho do dinheiro: ele saía de duas contas de Marcos Valério no Banco do Brasil, transitava pelo Banco Rural e, em seguida, era repassado aos beneficiários reais (leia o quadro "Os novos beneficiários"). Essa mesma linha de investigação possibilitou a descoberta de recursos desviados a parentes de políticos, como o irmão do senador Romero Jucá e o genro do ex-senador Marco Maciel, do DEM.  
O JUIZ DO CASO
O ministro Joaquim Barbosa, em seu gabinete no Supremo. Ele recebeu o resultado das investigações da PF e é o relator do processo do mensalão
O relatório da PF demonstra que, dos cerca de R$ 350 milhões recebidos pelas empresas de Valério do governo Lula, os recursos que mais se destinaram aos pagamentos políticos tinham como origem o fundo Visanet. Pela falta absoluta de controles internos no banco, esse fundo permitia desvios com mais facilidade. Para completar, o banco costumava adiantar os recursos antes que quaisquer serviços fossem prestados. Diz o relatório: “O adiantamento de recursos vinculados ao Visanet configurava, assim, uma das principais fontes de recursos do esquema montado por Marcos Valério para o financiamento político e consequente montagem de redes de influência, vez que o desvio desta verba era facilitada pela total inexistência de qualquer contrato formal para sua execução, bem como pela ausência de formalização de instrumento, ajuste ou equivalente para disciplinar as destinações dadas aos adiantamentos oferecidos às agências de publicidade”.
A pedido do ministro Joaquim Barbosa, a PF desvendou um dos mistérios mais estranhos do governo Lula: a relação do banqueiro Daniel Dantas com o PT. Antes de chegar ao poder, os líderes do partido sempre combateram a gestão de Dantas à frente do grupo que coordenava os investimentos dos principais fundos de pensão do país. Quando Lula assumiu, Dantas estava envolvido numa briga aberta para manter o controle desses investimentos, sobretudo da Brasil Telecom, um gigante do mercado de telefonia. O PT passou, então, a emitir sinais conflitantes sobre que lado assumiria nessa disputa. Alguns integrantes do governo articulavam para derrubá-lo, enquanto outros hesitavam em tomar lado. Em depoimento à PF, Dantas disse que, em meio a esse cenário ambíguo, foi convocado pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu, para uma reunião no Palácio do Planalto.
O relatório final da PF foi entregue ao Supremo
Tribunal Federal no final de fevereiro
Segundo Dantas, o encontro deu-se no dia 4 de maio de 2003. Na reunião, Dirceu teria dado sinal de uma oportunidade de conciliação com Dantas e encarregado o então presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, de manter diálogo com o banqueiro. Onze dias depois, Carlos Rodemburg, sócio de Dantas, encontrou-se com Marcos Valério e Delúbio Soares no hotel Blue Tree, em Brasília, na suíte do tesoureiro do PT. De acordo com o depoimento do sócio de Dantas, Delúbio disse que o partido estava com um “deficit” de US$ 50 milhões – e pediu dinheiro. Não foi dito abertamente, mas o subtexto era evidente: se Dantas pagasse, teria ajuda do governo para se manter à frente de seus negócios.
À PF, Dantas disse que se negou a pagar. Procurado por ÉPOCA, Dantas confirmou, por meio de sua assessoria, o que afirmara em seu depoimento – inclusive o pedido de “ajuda” de Delúbio. E deu suas razões para não ter aceitado a oferta: “O Opportunity (banco comandado por Dantas) era gestor do fundo de investimentos que abrigava recursos do Citigroup. O banco americano foi consultado. A decisão do Citigroup foi informar que não tinha como ajudar”. Também afirmou que, depois de Rodemburg informar Delúbio da negativa, passou a ser perseguido pelo governo.
Dois anos depois, não se sabe por que, a Brasil Telecom, empresa ainda controlada por uma subordinada de Dantas, celebrou dois contratos com a agência DNA, de Marcos Valério, cada um deles no valor de R$ 25 milhões. Os depoimentos dos funcionários da Brasil Telecom à PF revelam que os contratos foram fechados em poucos dias, sem que ninguém da área de marketing soubesse dos motivos das pressa, nem sequer que serviços seriam prestados. Semanas depois, sobreveio o escândalo do mensalão. Apenas R$ 3,6 milhões foram efetivamente repassados às contas de Marcos Valério. Ao rastrear o dinheiro, a PF verificou que os recursos chegaram a doleiros paulistas – e ainda não descobriu a identidade dos beneficiários finais. Para os investigadores, os destinatários foram indicados pela turma do PT e do publicitário Marcos Valério. Na resposta que enviou por meio de sua assessoria, Dantas omitiu a existência desses contratos. Afirma o relatório: “Os contratos (...) foram celebrados apenas com o objetivo de conferir a fachada de legalidade necessária para a distribuição de recursos, na forma de doações clandestinas ou mesmo suborno, negociados ao longo de dois anos entre os representantes dos grupo Opportunity e do Partido dos Trabalhadores, sempre com a indelével intermediação do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza”.
As provas reunidas pela PF constituem a última esperança do ministro Joaquim Barbosa e da Procuradoria-Geral para que o Supremo condene os réus do mensalão. Nos últimos anos, as opiniões dos ministros do STF sobre o processo modularam-se ao ambiente político – que, sob a liderança simbólica e moral do ex-presidente Lula, fizeram o caso entrar num período de hibernação. Alguns ministros, que em 2007 votaram por acatar a denúncia do Ministério Público, agora comentam reservadamente que as condenações dependem de “mais provas”. Hoje, portanto, o Supremo se dividiu. Não se sabe o desfecho do processo. Sabe-se apenas que, quanto mais tempo transcorrer, maior a chance de absolvição dos mensaleiros. Se isso acontecer, a previsão feita por Delúbio Soares, num passado não tão remoto, num país não tão distante, vai se materializar: o mensalão virará piada de salão. Será o retorno da ficção: era uma vez um país sério.