GDF
confia na Câmara Legislativa para alterar detalhes do projeto que obriga
empresas contratadas pelo poder público a criarem programas de integridade.
Novo texto tem apoio do setor produtivo e precisa ser votado até 1º de junho
Uma lei anticorrupção aprovada no ano passado
pela Câmara Legislativa colocou o Distrito Federal na vanguarda do combate a
desvios de recursos públicos. A capital federal foi a segunda unidade da
Federação a obrigar empresas contratadas pelo governo a criar programas de
integridade, com normas de compliance. A previsão é de que as regras entrem em
vigor a partir de 1º de junho. Mas detalhes da legislação, como os valores
estabelecidos como base, geraram reclamações do setor produtivo. Os empresários
alegam que as exigências podem quebrar companhias, sobretudo as de pequeno
porte. O governador Ibaneis Rocha enviou à Câmara um novo texto, com alterações
na lei. Se a proposta não for aprovada até sexta-feira, centenas de empresas
ficarão sujeitas a multas.
A Lei nº 6.112/2018, de autoria do ex-deputado
distrital Chico Leite, obriga firmas com contratos acima de R$ 80 mil com o GDF
a desenvolver programas internos de combate à corrupção. O valor é para compras
e serviços e, no caso de obras, a exigência vale para contratos acima de R$ 650
mil. Entidades do setor produtivo, como as federações do Comércio e das
Indústrias do Distrito Federal, cobraram mudanças no texto. A adoção de
programas de compliance requer investimentos, além da contratação de
consultorias ou de pessoal especializado, o que, segundo representantes do
empresariado, pode inviabilizar negócios menores.
A menos de 10 dias da entrada em vigor da
norma, o governador protocolou o projeto na Câmara Legislativa e espera contar
com o lobby do setor produtivo para aprovar o texto antes de 1º de junho. O
novo projeto do GDF muda os limites estabelecidos no texto anterior. A ideia é
de que só empresas com contratos acima de R$ 5 milhões sejam obrigadas a
desenvolver programas de compliance.
Segundo dados do governo, 114 dos 1.835
contratos iniciados em 2018 apresentaram valor global superior a R$ 5 milhões,
o que corresponde a 6,2% do total. Em termos de volume, entretanto, eles
representam 77,7% de todos os acordos fechados no ano passado. “Se não for
alterada, essa lei causará muita confusão, além de prejuízos, sobretudo às
micro e pequenas empresas. Uma coisa é exigir programa de integridade de
empresas de porte maior, outra coisa é estabelecer a exigência para pequenos
negócios”, ressalta o controlador-geral do Distrito Federal, Aldemário Castro.
O projeto de lei também muda a data de
vigência: em vez de começar a valer em 1º de junho, a norma só passaria a ser
adotada em 1º de janeiro de 2020. Outra mudança é que, em vez de atingir contratos
em andamento, a regra passaria a valer apenas para acertos firmados após o
próximo ano.
Exigência
O primeiro vice-presidente da Federação das
Indústrias do DF (Fibra), Pedro Henrique Verano, diz que o setor produtivo
defende a implementação de programas de integridade. "Pedimos ao governo
que alterasse apenas o prazo de adequação e o valor dos contratos. São ajustes
importantes, e não uma tentativa de postergar a adoção das normas",
explicou. "A lei está inexequível nos moldes atuais. Com o patamar de R$
80 mil, a regra abarca praticamente todos os contratos, até os de pequenos
serviços e reparos. Fizemos a sugestão de aumentar o valor, mas isso não vai
impedir que pequenas empresas também tenham normas de compliance",
acrescenta.
Segundo Pedro Henrique, grandes empresas de
setores como a construção civil cobram a adoção dessas práticas na hora de
fazer subcontratações. Diante da necessidade imposta pela legislação, a Fibra,
em parceria com o Sebrae, vai oferecer consultoria a preço subsidiado para capacitar
e formar equipes de integridade de empresas.
O primeiro estado a adotar a exigência de
programas de compliance para empresas que contratam com o governo foi o Rio de
Janeiro. Lá, a obrigatoriedade vale para contratos acima de 650 mil e R$ 1,5
milhão, respectivamente, para compras e para obras. No Rio Grande do Sul,
terceira unidade da Federação a usar desse expediente, os valores estabelecidos
foram de R$ 176 mil e R$ 330 mil. O governo federal não tem uma legislação a
respeito do tema, mas tramitam no Congresso Nacional projetos de lei que criam
regras semelhantes.
Variáveis
Ex-ministro-chefe da Controladoria-Geral da
União (CGU), Jorge Hage estava à frente do órgão à época da aprovação da lei
anticorrupção e dos debates sobre programas de integridade. Especialista no
tema e consultor na área, Hage explica as variáveis que devem ser analisadas
para estabelecer exigências das empresas que fazem negócios com o poder
público. “É preciso observar o valor do contrato, o porte da empresa, a duração
do contrato, além de fazer a distinção entre obras, compras e prestação de
serviço. Deve ser exigida uma efetiva avaliação individual de cada empresa para
verificar se ela, de fato, implantou um programa de compliance ou se o projeto
ficou apenas no papel”, explica o ex-ministro.
Hage aponta um aspecto falho na norma aprovada
no ano passado. O texto prevê que cabe aos fiscais e gestores dos contratos
verificar a real adoção dos programas de integridade. “Defendo que essa
avaliação não seja feita nem pelo fiscal nem pelo gestor do contrato, mas por
um órgão central de controle e integridade. Senão, isso pode resultar em uma
absoluta falta de isonomia no tratamento das empresas”, alerta o especialista.
O novo projeto de lei estabelece que o responsável pela fiscalização será
definido em uma regulamentação futura.
O secretário de Assuntos Parlamentares do DF,
Bispo Renato Andrade, adianta que o governo vai mobilizar os distritais para
votar o tema na próxima semana. “É um projeto que precisa ser apreciado até o
dia 1º. Senão, haverá problemas e complicações para as empresas do Distrito
Federal. O governo e a Câmara Legislativa não querem que isso aconteça”,
argumenta.
Punição diária
A lei prevê que empresas que não desenvolverem
programas de integridade ficam sujeitas a multa diária de 0,1% do valor do
contrato firmado com o governo. O percentual é aplicado sobre o valor
atualizado do contrato, limitado a 10% do preço global.
R$ 80 mil
Valor do contrato que a atual legislação prevê
para a empresa desenvolver programa de combate à corrupção.
Fonte: Correio Braziliense