O
governo local fará a regularização dos terrenos ocupados por igrejas e
entidades em troca de serviços gratuitos de assistência social. No total,
apenas 9% desses lotes estão em condições plenas de funcionamento no Distrito
Federal
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O Lar dos Velhinhos Bezerra de Menezes fica em Sobradinho e oferece atendimento médico, fisioterapia e atividades de lazer: necessidade(foto: Ed Alves/CB/D.A Press) |
O Distrito Federal tem 1,8 mil imóveis ocupados
por templos religiosos e entidades de assistência social, mas apenas 9% desses
terrenos estão regularizados. Muitas igrejas e instituições sem fins lucrativos
não buscam a legalização do lote porque não têm recursos para a compra ou para
pagar a taxa de uso da área pública. Para tentar ampliar esse número, o governo
começou a adotar uma nova modalidade de negociação: a legalização em troca de
moeda social. As instituições assinam um contrato de concessão do direito real
de uso por um prazo de 30 anos e, em troca, oferecem serviços de assistência
social gratuitos.
Essa possibilidade é prevista na Lei
Complementar nº 873/2013 (leia O que diz a lei). Seis anos depois de editada, a
legislação nunca havia sido aplicada no Distrito Federal. Neste mês, a Agência
de Desenvolvimento de Brasília (Terracap) homologou os dois primeiros contratos
na modalidade de regularização por moeda social. Os acordos foram com o Lar dos
Velhinhos Bezerra de Menezes, em Sobradinho, e com a Casa do Caminho, em
Taguatinga. A primeira atende idosos em situação de vulnerabilidade social, e a
segunda, crianças carentes e adolescentes em conflito com a lei. O contrato com
o Lar dos Velhinhos, que tem o processo mais adiantado, deve ser oficializado
em uma cerimônia com a presença do governador Ibaneis Rocha nos próximos dias.
A norma que regularizou igrejas e terrenos de
entidades sociais é de 2009, mas o texto sofreu alteração em 2013, para incluir
a legalização por moeda social. Segundo a legislação, a concessão de direito
real de uso pode ser gratuita desde que a entidade comprove a prestação de
serviços e a execução de programas de atenção “de forma gratuita, continuada,
permanente e planejada”. O público-alvo dessas políticas, de acordo com a lei,
são crianças, adolescentes, idosos, deficientes, dependentes químicos e pessoas
em situação de risco. Entre os serviços que podem ser ofertados como
contrapartida pela legalização fundiária estão vagas em creche, prestação de
assistência social e atendimento de usuários de drogas.
A coordenadora do Lar dos Velhinhos, a
psicóloga Priscila Fernandes, comemora a regularização por esse modelo. No
terreno, em Sobradinho, a entidade oferece atendimento médico, fisioterapia e
serviços como fonoaudiólogo a idosos carentes, além de atividades de lazer.
“Atendemos hoje 70 idosos. Com a segurança da regularização, o nosso projeto é
oferecer atendimento a mais 40 pessoas”, conta Priscila. A entidade social não
tem fins lucrativos e só atende pessoas em vulnerabilidade social — são 36
mulheres e 34 homens acolhidos pelo Lar dos Velhinhos.
Fiscalização
O presidente do Conselho de Pastores
Evangélicos do Distrito Federal, Josimar Francisco da Silva, também apoia a
adoção do novo modelo de regularização de igrejas. “Esse processo se arrastou
por tanto tempo porque a maioria das igrejas não tem recursos. Mas, como boa
parte delas oferece serviços à população, agora será possível buscar a
legalização dos lotes”, explica o pastor. “Muitas igrejas oferecem serviço de
creche, de assistência social a idosos e drogados e cursos profissionalizantes.
O governo não consegue atender sozinho essa área social, e as igrejas têm
espaço, têm interesse e têm voluntários para atuar nesses projetos”, comenta.
O diretor de Regularização Social e
Desenvolvimento Econômico da Terracap, Leonardo Mundim, conta que, dos 1,8 mil
imóveis ocupados por igrejas, só 175 foram legalizados. “Sem a regularização
desses lotes, as entidades não pagam a contraprestação pecuniária pela ocupação
dos terrenos, e o governo não pode despejá-las. Agora, elas terão segurança
jurídica e o registro da concessão na matrícula do imóvel”, conta Mundim. Ele
explica que o GDF fará uma fiscalização nas entidades beneficiadas. “Se houver
desvirtuamento dos termos previstos no contrato, a entidade terá de pagar todas
as taxas retroativas”, acrescenta o diretor da Terracap. O valor da taxa de
ocupação das igrejas é de 0,3% sobre o valor da avaliação do imóvel. Quem
oferecer serviços à população ficará isento do pagamento desse valor.
Leonardo Mundim conta que o Executivo local
reviu os processos para acelerar a nova modalidade de regularização dos
templos. “Um dos principais projetos do governo Ibaneis Rocha é regularizar a
cidade. A Seduh (Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação) fez uma
força-tarefa para atualizar todos os processos e verificar quais entidades se
enquadram na lei. O texto exige a comprovação de que a instituição ocupava a
área em dezembro de 2006”, detalha o diretor da Terracap.
Faltam
vagas em creches
Para ser beneficiada, a entidade tem de
apresentar um plano de ação à secretaria responsável pela área de atuação do
projeto. Iniciativas de oferta de vagas em creche, por exemplo, devem tramitar
na Secretaria de Educação. O processo na sequência passa pela Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) até receber o aval da Terracap.
O DF tem hoje um deficit de 16 mil vagas em
creches. Um dos projetos do governador é resolver esse problema, e a
regularização com moeda social é um excelente caminho para implementar o
projeto”, explica o diretor de Regularização Social e Desenvolvimento Econômico
da Terracap, Leonardo Mundim. Para serem beneficiadas com o contrato de
concessão de uso gratuito, as entidades e igrejas não precisam demonstrar
incapacidade financeira. Basta obter a aprovação do plano de ação.
A oferta de vagas em creches pelas igrejas
resolve um problema social e ajuda mães que não têm com quem deixar os filhos
para ir trabalhar. Mas especialistas defendem que o ensino das classes iniciais
deve ter critérios técnicos, com a atuação de profissionais qualificados.
“Quanto menor a criança, maior deveria ser o nível de formação de quem cuida e
educa”, alerta a doutora em educação infantil e professora aposentada da
Universidade de Brasília (UnB) Fátima Guerra.
O que
diz a lei
A Lei Complementar nº 873/2013 estabelece que a concessão de direito real de uso para templos e entidades sociais pode ser feita sem cobranças, “desde que a entidade comprove que, de forma gratuita, continuada, permanente e planejada, presta serviços, executa programas ou projetos de atenção aos beneficiários”. Segundo a Lei Complementar nº 806/2009, que, primeiramente, tratou da regularização de igrejas e instituições sociais, esses serviços devem beneficiar “crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, dependentes químicos ou pessoas que comprovadamente vivam em situações de risco”.
Fonte: Correio Braziliense